QUESTÃO DE ORDEM PRÁTICA 2/2012 - ABONO DE PERMANÊNCIA. NATUREZA REMUNERATÓRIA. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS.
PA, 8/8/2011
A partir da Emenda Constitucional nº 41/2003,
o abono de permanência passou a ser
palco de inúmeras controvérsias, seja em sede judicial, seja em âmbito
administrativo.
A principal questão envolvendo o direito à
percepção do abono de permanência previsto
no art. 40, § 19, da Constituição Federal, no art. 2º, § 5º, e no art. 3º, §
1º, da Emenda Constitucional n° 41, e no art. 7° da Lei n° 10.887/2004, está
centrada na natureza jurídica do abono: se de cunho remuneratório ou indenizatório.
Em nosso livro “Regime Próprio de Previdência Social”[1] sustentamos a tese
da natureza remuneratória do abono, não somente pelo dado histórico de sua
concepção, cuja origem remonta ao Decreto do Príncipe Regente Dom Pedro de Alcântara,
baixado em 1º.10.1821, como em face das características jurídicas que permeiam
o direito posto, pautado em valor pecuniário equivalente ao quantum da contribuição previdenciária, devido
aos servidores que, tendo satisfeito as condições para aposentadoria voluntária,
optaram em permanecer na atividade.
Cuida-se, em verdade, de um incentivo
remuneratório em favor do servidor que, por livre vontade, permanece ativo no
serviço público. Não se trata de compensação patrimonial por perda de direito
ou de recomposição de dano havido, eis que este inexiste. Certamente é medida
que interessa ao Sistema Previdenciário do Servidor Público e à Administração, eis
que desonera temporariamente o sistema de novas aposentadorias ao tempo em que
adia novos provimentos de cargos públicos, com a prerrogativa de manter nos
quadros de pessoal servidores experientes e capacitados para o seu mister. Mas
é só isso.
Todavia, em que pesem as mencionadas
características, a equivalência de valores entre o abono de permanência e a
contribuição previdenciária, aliado ao fato da exclusão do abono da base de
cálculo da contribuição (Lei nº 10.887/2004), trouxe à baila a tese
indenizatória do instituto. Vale trazer a lume um dos julgados que a adotaram:
Ementa
“TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. ABONO DE PERMANÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. NATUREZA
INDENIZATÓRIA. ART. 40, PARÁGRAFO 19, CF. EC 41/03. APELAÇÃO E REMESSA
NECESSÁRIA IMPROVIDAS. PRECEDENTES.
-
Insurge-se a Fazenda Nacional contra sentença que determinou a suspensão do
desconto de imposto de renda incidente sobre o abono de permanência pago aos servidores do TRT.
- O abono de permanência instituído pela emenda constitucional 41, de 19/12/2003, corresponde a
uma gratificação concedida ao servidor que, já tendo preenchido todos os
requisitos legais para a aposentadoria voluntária, decida permanecer em
atividade até atingir a idade para a retirada compulsória do serviço público.
- A perfeita análise do artigo 40, parágrafo
19 da Constituição Federal com a redação dada pela Emenda Constitucional 41, de 19.12.2003, deixa ver que
o legislador buscava beneficiar os servidores que no instante em que
completaram as exigências necessárias para a aposentadoria voluntária, fizeram
a opção por permanecer no serviço público, mantendo a sua experiência para os
novos quadros, recebendo em troca o que se denominou de abono de permanência com valor equivalente à contribuição
previdenciária, percebendo tal verba até o instante em que completasse o tempo
de aposentadoria compulsória.
- A verba em questão tem nítido caráter indenizatório, significando a reposição do patrimônio ao
estado em que se encontrava antes do dano, compensar alguém da perda de alguma
coisa que de modo voluntário, não perderia. O abono de permanência não se caracteriza como aquisição de
disponibilidade jurídica ou econômica, nos termos do artigo 43 do Código
Tributário Nacional, tendo caráter de reparação. - Apelação e remessa
necessária não providas. (TRF 5ª, APELREEX - Apelação/ Reexame Necessário – 1633, Des.
Frederico Pinto de Azevedo, DJE 23/6/2010, p. 94)
De toda
sorte, não é demais lembrar que no Superior Tribunal de Justiça a questão foi
objeto de divergências entre a 1ª[2]
e a 2ª Turmas, prevalecendo, ao final, o posicionamento que albergava a
natureza remuneratória. A saber:
EMENTA
PROCESSUAL
CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO RECURSO
ESPECIAL REPETITIVO. ABONO DE
PERMANÊNCIA. INCIDÊNCIA DO
IMPOSTO DE RENDA. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA.
REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.
1. Por inexistir fundamento constitucional suficiente,
por si só,
para manter o acórdão do Tribunal de origem quanto à
questão impugnada no recurso especial, não há falar em incidência da Súmula
126/STJ.
2. Esta Seção manifestou-se sobre a natureza
jurídica do abono de permanência, quando prestigiou, no acórdão embargado,
o entendimento da
Segunda Turma, que, ao
julgar o REsp
1.105.814/SC, sob a
relatoria do Ministro
Humberto Martins, reconhecera a incidência do imposto de renda sobre o
aludido abono com base nas seguintes razões de decidir: "O abono
de permanência trata-se
apenas de incentivo à
escolha pela continuidade
no trabalho em
lugar do ócio remunerado. Com
efeito, é facultado
ao servidor continuar
na ativa quando
já houver completado as
exigências para a
aposentadoria voluntária. A permanência
em atividade é
opção que não
denota supressão de
direito ou vantagem do
servidor e, via de consequência,
não dá ensejo
a qualquer reparação ou recomposição de seu patrimônio. O abono
de permanência possui, pois, natureza
remuneratória por conferir
acréscimo patrimonial ao beneficiário e configura fato
gerador do imposto de renda,
nos termos do artigo 43 do Código Tributário
Nacional." (grifou-se). Com
efeito, o abono de permanência é produto do
trabalho do servidor
que segue na
ativa, caracterizando inegável acréscimo patrimonial, o que enseja
a incidência do imposto de renda. Não cabe a alegação de que o abono
de permanência corresponderia a
verba indenizatória, pois não se
trata de ressarcimento por gastos realizados no exercício da função ou de
reparação por supressão de direito.
3. Verificar se o acórdão embargado enseja
contrariedade a normas e princípios positivados na Constituição é matéria afeta à competência
do Supremo Tribunal Federal, alheia ao plano de competência do Superior
Tribunal de Justiça, mesmo que para fins
de prequestionamento, conforme
entendimento da Corte
Especial (EDcl nos EDcl nos EREsp 579.833/BA, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de
22.10.2007).
4. Embargos declaratórios rejeitados. (EDcl
no Resp n° 1.192.556 –PE, Min. Relator Mauro Campbell Marques, DJe 17.11.2010)
Pois bem, sob tal perspectiva, se dúvidas
existiam com relação à incidência do imposto de renda sobre o abono, estas
agora foram dirimidas. Mas não foram somente estas as dúvidas desfeitas. Em
sendo parcela remuneratória, a conotação emprestada também traz luzes
favoráveis ao ingresso do abono de permanência na composição do teto
constitucional de que cuida o inciso XI do art. 37 da Constituição Federal; bem
como no cômputo da despesa com pessoal de que dispõem o art. 18, da Lei
Complementar n° 101, de 2000 (LRF).
No que tange à integração do
abono de permanência na remuneração devida ao servidor por ocasião de licenças
previstas na Lei n° 8.112, de 1990, o tratamento não deve ser diverso do
adotado para as demais parcelas remuneratórias, como, aliás, explicitou
recentemente o Tribunal de Contas da União em consulta formulada pelo
Presidente da Câmara dos Deputados, objeto do Acórdão n° 1209/2011, Plenário, in verbis:
9.1. conhecer da presente consulta, por preencher os requisitos ínsitos nos arts. 264 e 265 do Regimento Interno, para responder ao consulente que não cabe a percepção do abono de permanência previsto no art. 40, § 19, da Constituição Federal de 1998, por servidores que solicitarem licença para tratar de interesses particulares, não importando se há ou não continuidade no recolhimento de contribuições previdenciárias para fins de contagem de tempo de contribuição, tendo em vista que:
9.1.1. a licença para tratar de interesses particulares tem
como características a cessação do percebimento de remuneração e a interrupção
das atividades funcionais;
9.1.2. o abono de permanência tem reconhecido caráter
remuneratório e não indenizatório, logo, está relacionado ao percebimento de
remuneração e não à manutenção de um vínculo meramente subsistente do servidor
com a Administração;
9.1.3. o pagamento do abono de permanência está relacionado à
continuidade das atividades funcionais do beneficiário e não à sua interrupção;”
(Sessão de 11/5/2011)
Não resta dúvida, portanto, que o
caráter remuneratório do abono de permanência impõe seja dado ao mesmo
tratamento equivalente às demais parcelas de igual natureza, com a ressalva em
relação à incidência da contribuição previdenciária, por força da isenção
conferida pela Lei n° 10.887, de 2004.
Maria Lúcia Miranda Alvares
[1]
ALVARES, Maria Lúcia Miranda. São Paulo: Editora NDJ, 2007.
[2] A 1ª Turma inclinando-se pelo
caráter indenizatório do abono (v. AgRg no Resp 1021817/MG, Min. Rel. FRANCISCO
FALCÃO, DJe 01.09.2008).
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