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ARTIGO: DA REDISTRIBUIÇÃO POR RECIPROCIDADE

                                 Por Maria Lúcia Miranda Alvares[1]


Resumo: A inconstitucionalidade do instituto da transferência acabou por desencadear um processo de migração para outros institutos jurídicos, como a redistribuição, a remoção, o aproveitamento e até mesmo a cessão, como forma de permitir a movimentação de servidores entre quadros de pessoal diversos, trazendo à baila uma complexa teia de interpretações responsável por desnudar os próprios institutos jurídicos colhidos como substitutos. Neste ensaio, o estudo versa sobre a redistribuição e as mutações que a transfiguraram ou estão a transfigurar.


Palavras chave: Redistribuição por Reciprocidade. Redistribuição em contrapartida. Movimentação de servidores. Lotação.



(i) Contextualização do tema



                     O acesso a cargo público, mediante concurso de provas ou de provas e títulos, tem propiciado concorrência de norte a sul do Brasil, abrindo espaço para ingresso de candidatos de todos os Estados da Federação que, hodiernamente, passam a compor o Quadro de Pessoal de órgãos públicos distantes de seu domicílio, deixando para trás família e amigos próximos.

                     A esperança depositada no novo espaço de trabalho, geralmente conquistado a duras penas, toma novo rumo quando ao assumir a função, o candidato, agora servidor, passa a conviver com o dilema de estar longe de familiares e amigos, fato que comumente leva a problemas emocionais de difícil solução - seja para a Administração, que precisa da força de trabalho em prol da coletividade; seja para o servidor, que não sendo onipresente, trabalha com a crise existencial oriunda da culpa.

                     O instituto da transferência, na forma concebida pela Lei nº 8.112/90, que possibilitava a movimentação de servidores entre quadros de pessoal diversos, foi banido do ordenamento jurídico, submetendo servidores públicos a buscar em outros institutos jurídicos - como a remoção, o aproveitamento e a própria redistribuição -, a fórmula mágica para driblar o cerco criado pelas amarras da exegese proclamada pelo Supremo Tribunal Federal ao princípio do concurso público.

                     Emblemática foi a decisão do Supremo Tribunal no MS 22.148-8/DF, em que o Ministro Carlos Velloso examinou a legitimidade de transferência de servidora pertencente a quadro de pessoal de um Tribunal Trabalhista para outro, onde restou consolidada a seguinte interpretação:

“A transferência constitui, pois, forma de provimento derivado. Trata-se de derivação horizontal, porque sem elevação funcional. É, pois, na lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, ‘a passagem horizontal – quer-se dizer, sem elevação funcional – do titular de um cargo para outro cargo. (...) Portanto, transferência se define como a mudança horizontal do ocupante titular de um cargo para outro cargo. Na União só há transferência, na hipótese de mudança de quadro.’ (Celso Antônio Bandeira de Mello, ‘Regime Const. dos Servidores da Administ. Direta e Indireta’. Ed. R.T., 2ª Ed. 1991, pág. 37).

A Constituição Federal estabelece, no inc. II do art. 37, de forma a não ensejar dúvida, que ‘a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.’ Quer dizer, não há investidura em cargo público – cargo isolado ou em carreira – sem aprovação prévia em concurso público. A transferência, conforme vimos, constitui forma de provimento ou de investidura em cargo público, tem-se, com ela, provimento ou investidura em cargo público sem concurso público. Dir-se-á que o servidor prestou, para ingresso no cargo de onde vem transferido, o concurso público. Isto não basta. Permiti-lo, seria exigir o concurso para primeira investidura, apenas – o que a Constituição pretérita permitia – quando a Constituição vigente estabelece que a investidura em cargo público somente se faz mediante concurso público.

O instituto da transferência, por outro lado, se permitido, poderia ensejar fraude à Constituição, ou, noutras palavras, poderia ensejar o descumprimento da finalidade maior do princípio constitucional do concurso público inscrito no art. 37, II, da Constituição.
           
            [...]

Ora, com a transferência, seria possível tangenciar o princípio: o candidato prestaria concurso público num determinado Estado onde a disputa não seria maior ou onde o meio intelectual fosse mais pobre, e por isso as provas seriam mais fáceis, e obteria, depois, transferência para igual cargo noutro Estado, onde o concurso, observadas as peculiaridades locais, fosse mais difícil, com ofensa, assim, ao princípio da igualdade em relação aos que estivessem disputando o concurso público mais difícil. O Juiz não pode ignorar o fato, sob pena de fazer justiça de laboratório. E se temos presente que são vários os Brasis, é de todo necessário que o jurista e o juiz não percam de vista a sociologia jurídica.” (o grifo não consta do original)


                     Imperioso chamar atenção para o fato de que o pedido de transferência que estava sendo objeto de análise no citado Mandado de Segurança dizia respeito à servidora que pertencia à Justiça do Trabalho e pretendia ser deslocada de um tribunal trabalhista para outro. Tal transferência foi julgada inconstitucional.

                     À guisa desse contexto histórico, a migração para outros institutos jurídicos tornou-se o remédio acolhido não somente pelo servidor, mas por muitos órgãos públicos, inclusive os oriundos do Judiciário, cujo consenso de idéias acaba por fomentar a prática que neste ensaio se pretende enfrentar sob o escopo não somente do processo histórico sobre o qual se assenta a redistribuição, mas sob o contexto jurídico-administrativo e sociológico da novel inteligência, na medida em que a sua aplicabilidade, em regra, traz efeitos nocivos à Administração Pública e, por derradeiro, à coletividade.
                         

(ii) Do Instituto da redistribuição no Direito Brasileiro



                     Existem, na Administração Pública, institutos jurídicos que são básicos, que não se encontram definidos nas legislações estatutárias, mas são institutos firmados doutrinariamente e sobre os quais se estruturam as legislações estatutárias[2], são eles: (i) função pública; (ii) classe; (iii) carreira; (iv) grupo ocupacional; (v) quadro de pessoal e, (vi) a lotação.   

                     O instituto da redistribuição, antes de ter sido positivado pela Lei nº 8.112/90, era um desses institutos, cuja concepção, irremediavelmente atrelada à lotação - como ainda hoje se encontra -, foi fartamente adotado pela Administração Pública por ocasião da Reforma Administrativa de 1967 sob o manto do previsto no Art. 99 do Decreto-Lei nº 200[3]. Faz-se essencial a leitura do citado dispositivo legal para que se possa lançar as bases históricas do instituto sub examine. Ei-lo:


"Art. 99. O Poder Executivo adotará providências para a permanente verificação da existência de pessoal ocioso na Administração Federal, diligenciando para sua eliminação ou redistribuição imediata.
                 
§ 1º Sem prejuízo da iniciativa do órgão de pessoal da repartição, todo responsável por setor de trabalho em que houver pessoal ocioso deverá apresentá-lo aos centros de redistribuição e aproveitamento de pessoal que deverão ser criados, em caráter temporário, sendo obrigatório o aproveitamento dos concursados.

§ 2º A redistribuição de pessoal ocorrerá sempre no interesse do Serviço Público, tanto na Administração Direta como em autarquia, assim como de uma para outra, respeitado o regime jurídico de pessoal do servidor.

§ 3º O pessoal ocioso deverá ser aproveitado em outro setor, continuando o servidor a receber pela verba da repartição ou entidade de onde tiver sido deslocado, até que se tomem as providências necessárias à regularização da movimentação.
§ 4° Com relação ao pessoal ocioso que não puder ser utilizado na forma dêste artigo, será observado o seguinte procedimento:
a) extinção dos cargos considerados desnecessários, ficando os seus ocupantes exonerados ou em disponibilidade, conforme gozem ou não de estabilidade, quando se tratar de pessoal regido pela legislação dos funcionários públicos;
b) dispensa, com a conseqüente indenização legal, dos empregados sujeitos ao regime da legislação trabalhista.
§ 5º Não se preencherá vaga nem se abrirá concurso na Administração Direta ou em autarquia, sem que se verifique, previamente, no competente centro de redistribuição de pessoal, a inexistência de servidor a aproveitar, possuidor da necessária qualificação.
§ 6º Não se exonerará, por fôrça do disposto neste artigo, funcionário nomeado em virtude de concurso."
           
                     Pois bem, fácil é vislumbrar que a redistribuição, desde os tempos mais distantes, era aplicada como ferramenta de reformulação da organização administrativa, sempre vinculada ao interesse público, sem desbordar, por lógico, dos direitos havidos pelo servidor na hipótese de redistribuição de cargo ocupado. Para melhor fixar o histórico normativo, traz-se a lume conteúdo de alguns decretos que materializaram as respectivas ações. Ei-los:


"DECRETO Nº 63.214, DE 5 DE SETEMBRO DE 1968.
Redistribui, com o respectivo ocupante, para o Quadro de Pessoal - Parte Especial, do Ministério do Trabalho e Previdência Social, cargo originário do extinto Lloyd Brasileiro - Patrimônio Nacional e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o artigo 83, item II, da Constituição e tendo em vista o disposto no artigo 99, parágrafo 2º, do Decreto-lei número 200, de 25 de fevereiro de 1967,
DECRETA:
Art. 1º Fica redistribuído, no Quadro de Pessoal - Parte Especial, do Ministério do Trabalho e Previdência Social, com o respectivo cargo, integrante do Quadro de Pessoal - Parte Suplementar, do Ministério dos Transportes (Decreto n° 60.339, de 8 de março de 1967), o servidor ......, Oficial de Administração, nível 14.
Art. 2º O Ministério dos Transportes remeterá ao Órgão de Pessoal do Ministério do Trabalho e Previdência Social, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação dêste Decreto o assentamento individual do funcionário movimentado por fôrça do disposto neste ato."
                          
        "DECRETO Nº 67.523, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1970.
Redistribui, com os respectivos ocupantes, para o Quadro de Pessoal - Parte Especial - do Ministério das Relações Exteriores, cargos originários da extinta autarquia - Serviço de Navegação da Amazônia e Administração do Porto do Pará e extinta Estrada de Ferro de Bragança (Quadro Extinto - Parte XIV - do Ministério dos Transportes) e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o artigo 81, item III, da Constituição, e tendo em vista o disposto no artigo 99, § 2º, do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967,
                      DECRETA:
Art. 1º Ficam redistribuídos, para o Quadro de Pessoal - Parte Especial - do Ministério das Relações Exteriores, com os respectivos cargos, integrantes do Quadro de Pessoal - Parte Suplementar - do Ministério dos Transportes, os seguintes servidores autárquicos:
I - Originários da extinta autarquia Serviço de Navegação da Amazônia e Administração do Pôrto do Pará
Professôra de Ensino Pré-Primário e Primário EC-514-11
1 - ......................
2 - ......................"
                     Muitos outros decretos poderiam ser reproduzidos para atestar a constância da utilização desse instituto, sempre destinado a dinamizar a Administração Pública por meio da distribuição adequada de cargos. Em verdade, a evolução inexorável dos modelos de gestão pública sempre requisitou a figura da redistribuição como ferramenta para consolidação da política eleita, tanto que na efervescência das idéias advindas com a redemocratização do Brasil, ainda sob os auspícios das diretrizes da Reforma Administrativa de 1967[4], as pseudos reformas do aparelho estatal trouxeram, mais uma vez, a redistribuição como figura central para viabilizar as intentadas mudanças. Abaixo segue a transcrição de parte do Decreto nº 93.552, de 1986, destinado a promover a redistribuição de servidores como uma das medidas julgadas necessárias para a reforma da Administração Pública à época:


       “DECRETO Nº 93.552, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1986

Dispõe sobre a redistribuição e o treinamento de servidores da Administração Federal Direta e das autarquias, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o artigo 81, itens III e V, da Constituição, e

Considerando que a implantação da Reforma Administrativa impõe adequada distribuição de pessoal no Serviço Público Federal;

Considerando que a eficiência requerida do aparelho estatal pressupõe, além de estruturas ágeis, pessoal qualificado e comprometido com os programas prioritários do Governo;

Considerando como fatores de dignificação da função pública a presteza e a eficácia no atendimento da população,

                      DECRETA:

Art. 1º - Os órgãos da Administração Federal Direta e as autarquias, na oportunidade dos estudos de reestruturação organizacional de que trata o artigo 5º do Decreto nº 93.212, de 3 de setembro de 1986, procederão a circunstanciado exame da força de trabalho de que dispõe, bem como daquela de que efetivamente necessitam para o desenvolvimento das respectivas atividades.

Art. 2º - A Secretaria de Administração Pública da Presidência da República - SEDAP, após aprovada a reestruturação organizacional do órgão ou autarquia, fixará a lotação ideal respectiva e indicará o excesso ou a carência de pessoal, para efeito de remanejamento.

Parágrafo único - Na hipótese da ocorrência da redução do quadro de pessoal, ficarão os servidores excedentes à disposição da SEDAP, para redistribuição nos termos do artigo 99 do Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967.

Art. 3º - A redistribuição, a ser efetivada pela SEDAP, levará em conta a carência de pessoal, identificada nos estudos da Reforma, bem como as prioridades estabelecidas pelo GERAP e dependerá de treinamento específico para o ajustamento dos servidores à nova situação funcional.”  (o grifo não consta do original)


                    À guisa desse roteiro, observa-se que a positivação da redistribuição pela legislação estatutária trouxe imanente essa concepção de instituto voltado para deslocar o cargo público, ocupado ou vago, de um órgão/ente para outro com o fim único de promover o realinhamento da força de trabalho a partir de diagnósticos de necessidades realizados em prol da funcionalidade eficiente da Administração Pública. Aliás, é em nome dessa funcionalidade eficiente que se promove uma série de medidas para o fortalecimento da capacidade institucional[5], dentre as quais se insere a redistribuição de cargos e funções públicas, que nada mais é do que uma das ferramentas utilizadas pela Administração Pública para aprimorar as suas atividades.

                    A redistribuição, portanto, é definida pelas legislações estatutárias como o deslocamento de cargo de provimento efetivo, ocupado ou vago no âmbito do quadro geral de pessoal, para outro órgão ou entidade do mesmo Poder[6]”, e, como tal, está a significar que o servidor redistribuído para outro órgão ou ente levará consigo o cargo, eis que é o cargo o deslocado e não o servidor. Esse deverá apenas seguir o cargo. Outra não é a orientação de Antônio Flávio de Oliveira:

“Nessas condições, portanto, o que se desloca não é o servidor, indo ocupar cargo de quadro diverso ao seu, mas o seu cargo que, por força de lei, deixa de figurar na estrutura de um determinado órgão, indo se instalar no quadro de outro. De forma que o servidor investido no cargo apenas acompanha essa movimentação.

Não ocorre, nesses casos, e nem pode ocorrer, sob pena de descaracterizar o instituto, a modificação do padrão vencimental como conseqüência desse tipo de deslocamento.[7](os grifos não constam do original)


                     Nesse passo, dois institutos de cunho estatutário se erigem como imprescindíveis para o entendimento dessa espécie de deslocamento. São eles: o quadro de pessoal e a lotação, pelo que se pinça de artigo de nossa lavra[8] o seguinte excerto para elucidar o tema:


José Cretella Júnior, em seu Direito Administrativo do Brasil[9], já preconizava, a par da lição de renomados mestres, que o uso da palavra quadro comporta certa generalidade. Citando Duez e Debeyre, para quem “quadro administrativo é um conjunto de cargos (postos) criados por disposição geral e regulamentar pelos textos orgânicos dos serviços”, refere à lúcida noção oferecida por Themistocles Brandão Cavalcanti no sentido de que quadro “obedece a um sentido formal, orgânico”, a significar que a sua constituição no Direito Positivo deve partir do interesse do serviço como motor para agregar um conjunto de cargos e funções necessários ao desenvolvimento dos serviços afetados a determinado órgão ou ente.
Hely Lopes Meirelles torna visível esse delineamento do quadro ao defini-lo como “conjunto de carreira, cargos isolados e funções gratificadas de um mesmo serviço, órgão ou Poder. O quadro pode ser permanente ou provisório, mas sempre estanque, não admitindo promoção ou acesso de um para outro.[10]” E, certamente, é o que se vislumbra nos diplomas legais que criaram e ainda criam ou alteram os diversos quadros de pessoal existentes, a exemplo da Lei n° 409, de 25 de setembro de 1948, que criou os quadros de pessoal da Justiça do Trabalho, constituído de cargos de carreira, cargos isolados e funções gratificadas (art. 1°), fixando os limites dos quadros a cada Região. E assim o é até os tempos atuais.
                [...]
É que a lotação, por definição, consiste no número de servidores necessários ao desenvolvimento de determinada atividade imputada a um dado órgão ou entidade.  Daí a conotação de relevância apontada por Cretella Júnior, para quem a lotação, enquanto “conjunto de servidores que devem exercer atividades numa repartição, deveria, para efetivar-se, ser precedida de cuidadosos estudos científicos que, procedendo a rigoroso levantamento estatístico das condições de um dado setor da Administração Pública, concluiriam com precisão matemática sôbre a quantidade do pessoal necessário para atender às finalidades do Serviço Público.” Ressaltava, ainda, o renomado jurista, que se processada empiricamente poderia se “lotar uma determinada repartição ou com número excessivo de servidores, onerando, dêsse modo, os cofres públicos, ou com servidores em número insuficiente para desempenho cabal das funções públicas, acarretando prejuízo aos administrados.[11]” Preocupação que se mostra inequivocamente atual.

No Estatuto de 1952, o instituto da lotação foi definido como “o número de servidores que devem ter exercício em cada repartição”. O atual Estatuto dos Servidores Públicos não trouxe qualquer definição sobre a locução, muito embora se tenha utilizado da expressão em diversos dispositivos, dentre os quais os elencados no instituto da remoção, com o qual possui intrínseca relação.

Nesse cotejo, verifica-se que a lotação, por corresponder à força de trabalho necessária ao desempenho de determinada atividade afetada a uma dada unidade organizacional, encontra-se atrelada ao número de cargos e funções que compõe determinado quadro de pessoal. É que a força de trabalho motiva a criação de cargos e funções, mas somente com a existência desses cargos e funções é que se pode alocar a força de trabalho. Assim, a lotação é uma figura ambivalente, pois vai espelhar não somente a distribuição dos cargos e funções integrantes de um dado quadro de pessoal em face da força de trabalho requisitada pela organização administrativa, como a própria alocação nominal dos servidores nesses cargos e funções. Daí a inafastável classificação de Hely Lopes Meirelles, para quem a “lotação pode ser numérica ou básica, e nominal ou supletiva: a primeira corresponde aos cargos e funções atribuídos às várias unidades administrativas; e a segunda, importa na distribuição nominal dos servidores para cada repartição, a fim de preencher os claros do quadro numérico.[12] (os grifos não constam do original)


                     Visto que quadro de pessoal é composto de cargos e funções e que esses são alocados em número necessário ao desenvolvimento das atividades do órgão ou ente para os quais se encontram vinculados, por certo, quando se fala em redistribuição se está a revelar que haverá deslocamento de cargos e funções no âmbito da estrutura de um dado órgão ou ente para outro de um mesmo Poder com vistas a acrescer ou aumentar a lotação numérica desse último, elevando, em regra, o número de cargos e funções que integram a estrutura do órgão ou entidade de destino[13].

                     Em outras palavras, a deficiência da força de trabalho que submete a Administração Pública a lançar mão da redistribuição é aquela vinculada à lotação numérica do órgão ou entidade. Ou seja, a insuficiência da força de trabalho é auferida a partir do número de cargos que integra o quadro de pessoal de um dado órgão ou entidade para fazer face ao desempenho de suas atividades administrativas. Não é o número de servidores que é levado em consideração, até mesmo porque este deve equivaler ao número de cargos existentes. Assim, a idéia básica da redistribuição é acrescer, em número, a lotação do órgão ou entidade de destino, aumentando efetivamente a sua força de trabalho em razão das mais diversas situações, todas de interesse da Administração Pública[14].

Nesse contexto, imperioso enfatizar que a redistribuição é instituto que não se coaduna com a simples necessidade preenchimento de cargo público somente porque este está vago e existe deficiência de recursos humanos no órgão. Para tal fim existe outra ferramenta jurídica: o concurso público. A redistribuição, contrariamente, é medida autorizada em razão da exigência de realocação de cargos, de ajustamento da lotação e da força de trabalho decorrentes da necessidade de serviço, inclusive nos casos de reorganização administrativa, extinção ou criação de órgão ou entidade. Portanto, a finalidade desse instituto é acrescer cargos à lotação numérica com vistas a dotar o órgão/ente de maior capacidade funcional ou, em outra linha, promover o equilíbrio na estrutura organizacional da Administração mediante a distribuição de cargos e funções a partir da demanda existente em cada órgão/ente.

A par de tal perspectiva jurídica, para legitimar a adoção dessa ferramenta institucional, a Lei n° 8.112/90 impõe a observância dos seguintes pressupostos: “(i) interesse da administração; (ii) equivalência de vencimentos; (iii) manutenção da essência das atribuições do cargo; (iv) vinculação entre os graus de responsabilidade e complexidade das atividades; (v) mesmo nível de escolaridade, especialidade ou habilitação profissional; (vi) compatibilidade entre as atribuições do cargo e as finalidades institucionais do órgão ou entidade[15]”. Nesse ponto, não se pode deixar de criticar a inserção de parte desses requisitos na legislação estatutária, dada a visível incoerência ou desnecessidade decorrente da própria natureza do instituto da redistribuição. Decerto, sendo a redistribuição conceituada como um deslocamento de cargo, não há que se falar em alteração de atribuições e de mudança dos demais consectários relativos à ocupação do cargo, tais como: vencimentos, grau de responsabilidade e complexidade das atividades exercidas e nível de escolaridade ou habilitação profissional, pois esses atributos são inerentes ao próprio cargo e, portanto, devem acompanhá-lo em sua movimentação. O que não pode deixar de existir na redistribuição, e que consta dos pressupostos relacionados, é a compatibilidade entre as atribuições do cargo e as finalidades institucionais do órgão ou ente que o irá receber, haja vista que o motivo que autoriza a utilização do instituto vincula-se à necessidade do serviço e, como tal, não seria admissível movimentar um cargo de um órgão/ente para outro sem que as atribuições desse cargo fossem compatíveis com as finalidades institucionais do órgão/ente de destino. 

Essas são as premissas básicas sobre as quais se assenta o instituto da redistribuição no Direito Brasileiro.


(iii) Da competência para redistribuição


Sob o escopo das premissas básicas acima alinhadas, verifica-se que a redistribuição, por força da extensão em que se processa, depende inexoravelmente de órgão ou ente com competência para dispor acerca da avaliação da capacidade institucional no âmbito de um quadro geral de pessoal.

Nesse contexto, vislumbra-se que a aplicação do instituto encontra-se subordinada não somente às regras de competência fixadas para a organização dos servidores públicos, como as relativas à própria organização, estruturação e funcionamento dos órgãos da administração pública, na medida em que é a partir delas que se traçam os contornos legitimadores da adoção dessa ferramenta.

A saber:

No que tange à competência para organização dos servidores públicos, sabe-se que os entes federados possuem autonomia para legislar em matéria de regime jurídico estatutário. Assim é que a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, ao escolherem o regime estatutário para disciplinar a relação jurídica mantida com os seus servidores[16], podem dispor acerca de sua organização e disciplina, estabelecendo as diretrizes para conduzir a trajetória funcional no curso das atividades desenvolvidas, consubstanciadas na previsão de regras para ingresso, promoção, movimentação, direitos, deveres, além das que versam sobre a extinção do vínculo, respeitados os limites constitucionais.

No bojo dessa racionalidade, tem-se que as normas postas no Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União são aplicáveis, apenas e tão somente, aos servidores federais[17], assim como são os estatutos editados pelos Estados-Membros e pelos Municípios em relação a seus servidores. Logo, a Lei nº 8.112, de 1990, é aplicável a todos os servidores públicos civis da União, independentemente da esfera de Poder a que estejam alojados, de modo que o instituto da redistribuição, previsto no Art. 37 do referido Diploma Legal[18], possui, em tese, igual abrangência.

Não obstante tal assertiva, é preciso saber quem, em âmbito federal, possui competência para processar a redistribuição. Sim, porque a redistribuição é ferramenta que tem por função deslocar cargos, ocupados ou vagos, para outro órgão ou entidade de um mesmo Poder, o que pode gerar invasão de competência sob o escopo das normas que dispõem sobre a estruturação, atribuição e funcionamento dos órgãos da administração pública, de modo que a inteligência a ser emprestada ao Art. 37, da Lei nº 8.112/90, deve envolver não somente o que ali foi disposto, mas os preceitos jurídicos que cuidam da organização administrativa.

Nesse passo, imperioso lembrar que o Estado pode tomar para si diretamente a prestação de suas atividades administrativas, ou, ainda, pode prestá-las por intermédio de outras pessoas por ele criadas, de forma indireta. No primeiro caso, diz-se que a Administração é direta, e no segundo, tem-se a figura da Administração Indireta. Porém, tanto numa como na outra forma de administrar, poderá existir partição de atribuições, individualizadas pela figura dos órgãos, então definidos pela melhor doutrina como “unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de atribuições do Estado”[19].

A par da breve síntese, interessa observar que antes da Constituição de 1988, a competência para “dispor sobre a estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos da administração federal” (Art. 81, V, da Constituição de 1967, com redação da Emenda nº 1, de 1969) era do Presidente da República e, como tal, todo o processamento relativo à matéria era feito por meio de decreto. Em outras palavras, em face do permissivo constitucional, a estrutura organizacional da Administração Pública podia ser realizada por meio de decreto presidencial.

A Constituição de 1988, em sua redação original, modificou essa sistemática: a competência para dispor sobre a organização e o funcionamento da administração federal muito embora tenha sido reservada ao Presidente da República, foi prevista para ser efetivada na forma da lei (Art. 84, VI, CF). A situação trouxe embargos à dinâmica própria da máquina estatal, haja vista que em matéria de organização administrativa a edição de lei passou a ser exigida[20], diversamente do que foi previsto para os Poderes Legislativo  e Judiciário, aos quais foi conferida atribuição normativa em matéria de organização administrativa (Arts. 51, IV, 52, XIII e 96, I, “b”, CF).

Em 2001, a Emenda Constitucional nº 32 alterou o Art. 84, VI, da Carta Maior, outorgando ao Presidente da República a prerrogativa de “dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções e cargos públicos, quando vagos”, de modo que, ainda que em sentido estrito, houve certo avanço no bojo da competência acerca da matéria, conforme encerra o magistério de José dos Santos Carvalho Filho[21], in verbis:


“A EC nº 32/2001, alterando este último dispositivo, fez remissão ao art. 84, VI, da CF, também alterado pela aludida Emenda, como vimos, segundo o qual é da competência do Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre organização e funcionamento da Administração Federal, desde que não haja aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos. Sendo assim, são legítimas a transformação e a reengenharia de órgãos públicos por ato privativo do Chefe do Executivo (e, portanto, dispensada lei) quando tais fatos administrativos se incluírem no mero processo de organização administrativa.
A nova diretriz constitucional já tinha o endosso de parte da doutrina, segundo a qual seria lícito que o Executivo criasse órgãos auxiliares, inferiores ou subalternos, desde que aproveitasse os cargos já existentes e tivesse competência delegada por lei, somando-se ainda a condição de não serem praticados atos que pudessem constranger a esfera jurídica dos particulares. De qualquer forma, a Constituição agora parece ter dirimido qualquer dúvida a respeito dessa possibilidade.” (o grifo não consta do original)


                                               Nessa linha de raciocínio, verifica-se que no âmbito do Poder Executivo, a estruturação administrativa ocorre, em regra, por meio de lei em sentido formal. Em se tratando de reorganização da estrutura administrativa, desde que não haja aumento de despesa, é possível a utilização de decreto para tal proceder.

                     Sob tal perspectiva, faz-se crível lembrar que os cargos e funções que traçam o desenho dessa estrutura administrativa são criados por lei em número certo para albergar o ideal funcionamento da máquina estatal. Em outras palavras, os cargos e funções que integram o quadro de pessoal de um dado órgão ou ente são criados, transformados e extintos por lei, salvo, quanto a essa última hipótese, se estiverem vagos, situação em que é permitida a sua eliminação por intermédio de competente decreto presidencial[22].

                     Com base no roteiro jurídico delineado, depreende-se que a redistribuição, enquanto ferramenta adotada para dinamizar a estrutura administrativa por meio de alocação de cargos, ocupados ou vagos, em órgãos/entes carentes de força de trabalho, segue a regra geral insculpida para ter ensejo o funcionamento da máquina estatal, qual seja: requisita autorização legal. Essa, aliás, a tese acolhida por Antônio Flávio de Oliveira, conforme a seguir:

“II Requisitos do ato de redistribuição

a)  Competência – É importante observar que a redistribuição não decorre da atuação do administrador, mas do Poder Legislativo, pois não se trata de simples remoção dos servidores, mas de reposicionamento do cargo que estes ocupam, em vista da extinção do órgão a que pertencem ou pelo redirecionamento da função que desempenham, para esfera de atribuição de outro órgão.

[...]

Conforme expresso anteriormente, quando se tratou dos requisitos do ato de redistribuição, especificamente do requisito de competência, ficou claro tratar-se de ato legislativo com reflexos na administração, cuja deflagração deve ser iniciada pelo Chefe do Poder Executivo correspondente, consoante expresso no art. 61, § 1º, II, ‘b’, da CF, a respeito da iniciativa reservada dos projetos de lei pertinentes a servidores públicos, e repetido, em função do princípio da simetria constitucional nas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais.
É, pois, ato que se inicia pela ação do Poder Executivo em relação aos cargos que compõem os quadros dos órgãos que integram a sua estrutura, mas cuja prática, porquanto deve ter a forma de lei, compete ao Poder Legislativo.[23] (grifo nosso)


                     Portanto, é a lei em sentido formal que desencadeia, em regra, o processo de redistribuição de cargos e funções. Não obstante, quando se tratar de reorganização administrativa que não implique em aumento de despesa não se faz necessária a edição de lei, processando-se a redistribuição de cargos e funções por meio de decreto ou até mesmo por ato de hierarquia inferior, desde que vinculado aos ditames da legislação que a autorizou, no caso, o Art. 37, da Lei n° 8.112/90.

                     Nesse diapasão, não é demais lembrar que a Lei nº 8.112, de 1990, deixa evidenciar, ainda, que a redistribuição de cargos pode ocorrer simplesmente para ajustamento de lotação e da força de trabalho entre diversos órgãos e entes públicos[24] no âmbito do mesmo Poder independentemente de reorganização administrativa, extinção ou criação de órgão ou entidade. Nessa hipótese, o instituto da redistribuição é adotado, tão somente, com vistas à melhoria do funcionamento da máquina administrativa, consubstanciando instrumento de fortalecimento da capacidade institucional, a teor do previsto no Decreto nº 6.944, de 2009, editado sob o escopo da competência prevista no Art. 84, inciso VI, alínea “a”, da Constituição[25], para estabelecer medidas de aprimoramento da organização federal direta, autárquica e fundacional. Vale a reprodução do Art. 1º do citado Decreto, a saber:
“Art. 1o  Para fins deste Decreto, considera-se fortalecimento da capacidade institucional o conjunto de medidas que propiciem aos órgãos ou entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional a melhoria das suas condições de funcionamento, compreendendo as de caráter organizacional, que lhes proporcionem melhor desempenho no exercício de suas competências institucionais, especialmente na execução dos programas do Plano Plurianual - PPA. 
§ 1o  As medidas de fortalecimento da capacidade institucional observarão as seguintes diretrizes:
I - organização da ação governamental por programas;
II - eliminação de superposições e fragmentações de ações;
III - aumento da eficiência, eficácia e efetividade do gasto e da ação administrativa;
IV - orientação para resultados;
V - racionalização de níveis hierárquicos e aumento da amplitude de comando;
VI - orientação para as prioridades de governo; e
VII - alinhamento da proposta apresentada com as competências da organização e os resultados que se pretende alcançar. 
§ 2o  O fortalecimento da capacidade institucional será alcançado por intermédio:
I - da criação e transformação de cargos e funções, ou de sua extinção, quando vagos;
II - da criação, reorganização e extinção de órgãos e entidades;
III - da realização de concursos públicos e provimento de cargos e empregos públicos;
IV - da aprovação e revisão de estrutura regimental e de estatuto;
V - do remanejamento ou redistribuição de cargos e funções públicas; e
VI - da autorização para contratação temporária de excepcional interesse público, nos termos da Lei no 8.745, de 9 de dezembro de 1993.” (o grifo não consta do original)

                     Ainda de acordo com o Decreto nº 6.944, de 2009, as propostas de que versam o § 2º do seu Art. 1º, dentre as quais se insere a redistribuição de cargos e funções, deverá ser encaminhada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e, quando couber, “submetidas à apreciação da Casa Civil da Presidência da República,” devendo conter necessariamente:
“Art. 2º............................
I - justificativa da proposta, caracterizando-se a necessidade de fortalecimento institucional, demonstrando o seu alinhamento com os resultados pretendidos, em especial no que se refere aos programas do PPA;
II - identificação sucinta dos macroprocessos, produtos e serviços prestados pelos órgãos e entidades; e
III - resultados que se pretende alcançar com o fortalecimento institucional e indicadores para mensurá-los.” 
                                                              
                     Nesse patamar de funcionalidade, a redistribuição pode ocorrer diante de duas situações jurídicas distintas: (i) da necessidade de ajustamento da força de trabalho em razão de reorganização administrativa, extinção ou criação de órgão ou entidade, com aumento de despesa, a ser processada com meio de autorização legislativa específica[26]; e, (ii) para fazer face ao fortalecimento da capacidade institucional, verificada simplesmente para o ajustamento de lotação e da força de trabalho às necessidades do serviço, a ocorrer independentemente de reorganização administrativa de órgãos e entes ou, ainda que dependente, que não implique em aumento de despesa, a ser processada por meio de decreto ou ato de hierarquia inferior com base na autorização disposta no Art. 37, da Lei n° 8.112/90, observadas as balizas relativas às normas de competência para o processamento sob escopo de um quadro geral de pessoal.

                     No âmbito do Poder Executivo, é assunto de competência do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão acoordenação e gestão dos sistemas de planejamento e orçamento federal, de pessoal civil, de organização e modernização administrativa, de administração de recursos da informação e informática e de serviços gerais;” nos termos do art. 27, XVII, “g”, da Lei n° 10.683, de 2003, cabendo à Secretaria de Recursos Humanos desse Ministério atuar como órgão central do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (SIPEC)-, gerindo, portanto, o intitulado quadro geral de pessoal de que cuida o art. 37 da Lei n° 8.112/90[27]. Por força dessa prerrogativa é que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão fez editar a Portaria n° 57, de 14 de abril de 2000, para disciplinar o instituto da redistribuição no âmbito do Poder Executivo, onde são previstas delegações de competência para outras autoridades, inclusive para o Secretário de Recursos Humanos daquele Ministério nas situações que especifica[28].

É preciso dizer ainda que, mesmo em se tratando de reorganização administrativa decorrente de ato legislativo em caráter específico, a incumbência do processo de redistribuição de cargos e funções vagos no âmbito do Poder Executivo é do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão[29], conforme se pode inferir no disposto no Art. 43, da Lei nº 9.649, de 1998, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e Ministérios. Eis o teor do dispositivo legal:


“Art. 43.  Os cargos efetivos vagos, ou que venham a vagar dos órgãos extintos, serão remanejados para o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão para redistribuição e os cargos em comissão e funções de confiança, transferidos para a Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, para utilização ou extinção de acordo com o interesse da Administração Pública.”[30] (o grifo não consta do original)
                    

Por derradeiro, é preciso enfatizar que as regras dispostas na Portaria n° 57, de 14 de abril de 2000, acima referida, estão a merecer críticas, especialmente por extrapolarem o campo da permissividade legislativa, conforme se verá mais adiante. 

                   Em relação ao Poder Judiciário, sabe-se que cada tribunal possui quadro próprio de pessoal, que são estanques, haja vista que os tribunais são órgãos independentes e dotados de competência constitucional para elaborar seus regimentos e regulamentos internos e, por seu turno, organizar as suas secretarias e serviços auxiliares (art. 96, I, “b”, CF).

                     As secretarias e serviços auxiliares de um tribunal são órgãos criados por normas editadas pelos próprios tribunais. Assim, em relação ao seu quadro de pessoal, poderá o tribunal fixar a lotação desses órgãos distribuindo os cargos e funções em razão dos diversos centros de competência que fez instituir. Do mesmo modo, pode cada tribunal extinguir órgãos por ele criados e reorganizar a sua administração, de forma que, nessa hipótese, poderá redistribuir os diversos cargos no âmbito de seu próprio Quadro de Pessoal[31].

                     Por meio dessa redistribuição, que nada mais é do que uma relotação de cargos, dá-se, em âmbito interno, o ajustamento da lotação e da força de trabalho às necessidades de serviço sem que para tanto seja requisitada a autorização do Poder Legislativo. Assim, sob o prisma da reorganização administrativa, cada tribunal possui competência para dispor acerca da redistribuição de cargos e funções, a ocorrer mediante simples alteração de seus regimentos e regulamentos. 

                     A redistribuição entre tribunais[32], entretanto, requer maiores cautelas. Primeiro porque diante da competência constitucional de que gozam, a redistribuição, enquanto forma de deslocamento de cargo ex officio[33], poderia ser tida como situação violadora da própria norma constitucional que confere aos tribunais a prerrogativa de autogoverno. Seria permitir que um dado tribunal invadisse a competência de outro para realizar o diagnóstico de suas necessidades e avaliar se a composição de sua força de trabalho estaria condizente com a demanda das atividades desenvolvidas. Por outro lado, em sendo o quadro de pessoal de cada tribunal criado por lei específica, vinculando o cargo ao quadro respectivo, e, inexistindo, no âmbito do Poder Judiciário, a figura de um quadro geral de pessoal sob o enfoque conferido pela Lei n° 8.112/90, a redistribuição de cargos nos moldes concebidos pela legislação estatutária somente poderia ser admitida, no âmbito do Judiciário, por meio de lei específica[34].

Entretanto, poder-se-ia argumentar que em face da própria autonomia administrativa de que gozam, poderiam os tribunais, em ação conjunta, promover a redistribuição de cargos efetivos, haja vista a essência da ferramenta, então voltada para fortalecer a capacidade institucional. Todavia, a medida não parece crível quando se depara com a ausência de um quadro geral de pessoal no âmbito do Poder Judiciário, assim concebido não como um quadro único criado por lei específica[35], mas como uma reunião de quadros de pessoal sob o controle de um órgão incumbido de avaliar as necessidades administrativas com vistas ao melhor funcionamento das competências institucionais[36], atribuição essa que pode ser inferida, em tese, do § 4° do art. 103-B da Constituição da República em favor do Conselho Nacional de Justiça.

Nesse patamar de funcionalidade, a competência para redistribuição de cargos entre tribunais estaria a requisitar, em princípio, autorização legislativa. Todavia, em tese, poder-se-ia entender admissível a redistribuição de cargos entre tribunais desde que processada por meio de órgão com competência para avaliar a capacidade institucional de cada qual e que sobre eles exerça o poder de supervisão administrativa, a ocorrer com a anuência dos tribunais[37] e sob o escopo permitido pela legislação estatutária.

No âmbito do Poder Legislativo, não obstante o pequeno espaço para o processamento da redistribuição de cargos, a própria competência constitucional já lhe autoriza dispor sobre a matéria por meio de resolução[38] (v. arts. 51, IV e 52, XIII, da CF).

Posta assim a questão da competência, passemos à análise da redistribuição por reciprocidade propriamente dita.

                               
(iii) Da Redistribuição por reciprocidade


                     Como foi dito, a redistribuição é instituto jurídico que tem por fim deslocar “cargo de provimento efetivo, ocupado ou vago, no âmbito do quadro geral de pessoal, para outro órgão ou ente do mesmo Poder”. Sob tal concepção, cabe, então, a indagação: o que seria a redistribuição por reciprocidade?

                      Sob o ângulo puramente empírico, assim referido porque essa figura é totalmente alienígena sob o contexto jurídico, a redistribuição por reciprocidade ou em contrapartida dá-se quando ocorre deslocamento simultâneo de cargos, ocupados ou vagos, entre órgãos do mesmo Poder. Em outras palavras, a redistribuição de um cargo é feita sob condição de deslocamento de outro cargo, conforme enseja o Art. 4° da Portaria n° 57, de 14 de abril de 2000, do Ministro de Estado do Planejamento Orçamento e Gestão. Ei-lo:

“Art. 4° A redistribuição de cargo ocupado ou vago somente poderá ser efetivada se houver, como contrapartida a redistribuição de um cargo efetivo, ocupado ou vago, do mesmo nível de escolaridade.”


                   Não precisa ter expertise no assunto para perceber que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão extrapolou o campo de sua atuação normativa[39] ao criar forma de deslocamento de cargo ao arrepio da legislação de regência. Aliás, ao assombro do sentido institucional e finalístico do próprio instituto.

                     Consoante o que foi dito, a redistribuição é ferramenta voltada para consolidar o interesse público em dotar o órgão/ente de destino de maior capacidade funcional diante do número insuficiente de cargos para fazer face ao desempenho das atividades administrativas, de modo que se extrai dessa perspectiva a constatação ou afirmação de que o órgão/ente de origem apresenta superávit em sua lotação[40], e, por corolário, ociosidade de força de trabalho, fato que por si só torna perfeitamente visível a insubsistência da intitulada redistribuição por reciprocidade, que exige contrapartida do órgão de destino, carente de cargos para desenvolvimento de suas atividades. Nesse contexto, a única forma de reciprocidade permitida no campo da redistribuição tem por fim atender demandas simultâneas ocasionadas pela necessidade de cargos diversos.

                     A saber:

                   Um órgão/ente que possui em seu quadro de pessoal excesso de cargos de uma dada categoria funcional e déficit em outra passível de compensar com órgão/ente em situação cuja realidade se apresenta oposta a sua pode vir a ser inserido na sistemática da redistribuição, por exemplo: um hospital público, cujo corpo funcional consigne excesso de médicos cirurgiões e déficit de médicos clínicos está apto a redistribuir cargos de médicos cirurgiões e receber contrapartida de cargos de médicos clínicos. É visível que o exemplo oferecido não consubstancia, efetivamente, uma contrapartida ou reciprocidade sob condição[41], eis que o sentido foi acrescer à lotação de um hospital público cargos de médicos clínicos e, no outro, de médicos cirurgiões, então necessários ao desenvolvimento e fortalecimento da capacidade institucional de cada qual.

À guisa dessa racionalidade, a exigência de contrapartida ou de reciprocidade de cargos públicos entre órgãos ou entes a título de redistribuição acaba por desvirtuar o instituto e, em muitos casos, empresta ao ato a nítida conotação de burla às regras e princípios que o norteiam, mormente quando as ocorrências estão a envolver pedidos e interesses de servidores, conforme se tem observado em sede administrativa depois do julgamento pela inconstitucionalidade do instituto da transferência pelo Supremo Tribunal Federal[42], prática que vem ganhando força desde o ingresso do candidato no serviço público.

Na verdade, os concursos públicos, hoje em nível nacional, têm oportunizado que pretensos candidatos a servidores concorram para vagas longe de seu domicílio apostando, desde logo, na utilização de mecanismos de retorno, dentre os quais a redistribuição. Os problemas gerados com a falsa idéia de que a redistribuição é um direito do servidor, ante a sua previsão na Lei n° 8.112/90, confere a esses candidatos a firme convicção de que um mundo melhor se descortinará depois da aprovação no concurso. E, para muitos, esse sonho está se tornando realidade, pois alguns órgãos, mormente os do Judiciário, têm proporcionado a concretização desses desejos sob o escopo de salvaguardar o próprio interesse público, eis que a redistribuição, na forma agasalhada, termina resolvendo os problemas comumente ocasionados pela utilização de outros mecanismos de afastamento, como a cessão e a remoção, também muito visitados.

Nesse sentido, a intitulada redistribuição por reciprocidade seria, por assim dizer, a ferramenta ideal para composição dos conflitos funcionais verificados no atual panorama nacional, na medida em que teria o condão de compor os interesses em jogo. O problema é que a conotação emprestada ao instituto em nada se assemelha à sua essencialidade. As características apresentadas correspondem a verdadeiras transferências, onde a troca de cargos entre órgãos é motivada preponderantemente por interesses individuais, atuando a aquiescência da Administração, apenas e tão somente, como fator de composição de possíveis conflitos. Juridicamente, portanto, o que se observa é a realização de transferências transvertidas em redistribuição por reciprocidade, conforme já deixou assente o Tribunal de Contas da União em inúmeros julgados. Ei-los:


          Acórdão 1690/2008- 1ª Turma

"6. [trechos do voto condutor da Decisão nº 900/1999-Plenário:]

'Não resta dúvida, como consignam os pareceres, de que a permuta de servidores entre os TRTs da Paraíba e de Pernambuco não encontra guarida no art. 37 da Lei nº 8.112/90, que trata do instituto da redistribuição.
Aliás, como consta expressamente no referido dispositivo, `redistribuição é o deslocamento de cargo de provimento efetivo (...) para ajustamento de lotação e da força de trabalho às necessidades dos serviços'.
Ao promoverem, os TRTs, redistribuições recíprocas, o efeito da redistribuição de fato foi, em conseqüência, nulo, uma vez que ambos os órgãos continuaram com sua lotação absolutamente inalterada. Ao final, o que restou foi apenas aquilo que em realidade se buscou desde o princípio, ou seja, a permuta de servidores entre os Tribunais.
A chamada `redistribuição por reciprocidade', pois, nada mais é do que uma dissimulação do antigo instituto da transferência, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 19/12/95 [...] e definitivamente banido de nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 9.527, de 10/12/97. Logo, não há como admitir sua subsistência no âmbito da Administração Pública.'

7. De qualquer forma, na linha dos pareceres da unidade técnica e da SERUR, penso que o recurso do TRE/RN merece prosperar, de maneira que seja resguardada a estabilidade das relações jurídicas constituídas, especialmente porque a 'redistribuição por reciprocidade" em causa, ocorrida em 28/9/98, estava revestida da presunção de legalidade, porquanto fundamentada em regulamentação do TST, que até então não havia sido questionada pelo TCU."
(os grifos não constam do original)


        Acórdão nº 3661/2009- 2ª Câmara

"Em relação à posterior redistribuição do Sr. [...], entendido pelo titular da Sefip como 'redistribuição por reciprocidade', faço os comentários que seguem.

11. O primeiro aspecto que julgo oportuno avultar é que este Tribunal, com efeito, condena a prática da redistribuição por reciprocidade por entender que ela configura a transferência, instituto banido da legislação pátria desde 1995, por meio de Decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Mandado de Segurança n.º 22.1487-8/DF.
12. Dessa maneira, essencial para o deslinde da questão se faz o real conhecimento do significado do instituto da transferência, razão pela qual me valho de lição de Antônio Flávio de Oliveira, exarada na obra Servidor Público - Remoção, Cessão, Enquadramento e Redistribuição, 2ª Edição, Editora Fórum, Belo Horizonte, 2005, páginas 59 e 60, in verbis:

                  [...]

13. Voltando ao exame do caso concreto, verifico que o Sr. [...] efetivamente mudou de órgão, de forma que se robustecem os indícios de irregularidades na redistribuição do referido servidor. Contudo, em que pese tais evidências, o ato de admissão em apreço permanece legal, eis que a irregularidade decorrente da redistribuição do Sr. [...] não se comunica a admissão do Sr. [...]"
(os grifos não constam do original)


          Acórdão 2366/2010 - Plenário

CONSULTA. DÚVIDA ACERCA DA POSSIBILIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO DE CARGOS ENTRE TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS PARA SUPRIR LACUNA ORIGINADA NA REMOÇÃO DE SERVIDORES. CONSULENTE INAPTO PARA PROPOSIÇÃO DO FEITO. NÃO CONHECIMENTO. CONSIDERAÇÕES ACERCA DA IMPOSSIBILIDADE DO PLEITO.
1. Não há previsão legal para redistribuição de cargo em razão de anterior remoção de servidor.
2. A remoção de servidores com a contrapartida da redistribuição de cargos vagos para preenchimento das lacunas surgidas na lotação do órgão de origem assemelha-se à transferência, instituto considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 19/12/1995, nos autos do Mandado de Segurança nº 22.148-8/DF, e definitivamente banido de nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 9.527/1997

[...]

9. Tal procedimento, independentemente da alcunha que lhe seja conferida, é veladamente considerado irregular tanto por esta Corte de Contas como pelo Supremo Tribunal Federal, conforme os seguintes excertos que trago à colação:
Ementa do Acórdão 1690/2008 - Primeira Câmara: "A permuta de cargos ocupados, denominada “redistribuição por reciprocidade”, configura o instituto da transferência, anteriormente previsto no art. 23 da Lei nº 8.112/1990, cujo comando foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (Mandado de Segurança nº 22.148-8/DF - DOU de 7/2/1996 e DJ de 8/3/1996), sendo depois expressamente revogado pela Lei nº 9.527/1997.";
Item 9.3 do Acórdão 701/2005 - Plenário: "9.3. determinar ao TRT/14ª Região que se abstenha da prática de redistribuição por reciprocidade dos cargos dos seus servidores com os de outros órgãos, inclusive do próprio sistema da Justiça do Trabalho, tendo em vista a falta de amparo legal, vez que tal hipótese não está contemplada pela Lei nº 8.112/1990, alterada pela Lei nº 9.527/1997, alertando aos responsáveis que o descumprimento desta determinação os sujeitará a aplicação das sanções previstas na Lei n. 8.443/1992;";
VOTO condutor do Acórdão 774/2004 - Plenário: "No mérito, a permuta de cargos efetuada entre diversos Tribunais Federais, sob a denominação de redistribuição, já foi exaustivamente debatida neste Tribunal. A jurisprudência que predomina a respeito, de fato, tende a tratar a matéria no sentido da proposta formulada pelo Secretário-Substituto da Secex-CE, ou seja, determinando que os órgãos deixem de promover a transferência de servidores, mediante “redistribuição por reciprocidade (...).";
RELATÓRIO do Acórdão 2096/2005 - Plenário: "22. Por fim, acrescenta-se, ainda, que este Tribunal tem recomendado aos órgãos interessados que cessem a prática de promover a redistribuição por reciprocidade dos cargos de seus servidores com os de outros órgãos, inclusive do próprio sistema da Justiça do Trabalho, tendo em vista a falta de amparo legal, já que tal procedimento não está previsto na Lei nº 8.112/90, alterada pela de nº 9.527/97, a exemplo dos Acórdãos nº 99/2004 - Plenário (Ata 4/94, Sessão 11/2/2004, TC 002.649/200-3), nº 1902/2004 - Plenário (Ata 46/04, Sessão 1/12/2004, TC 004.872/2000-1) e Decisão nº 289/2002 - Plenário (Ata 10/02, Sessão 3/4/2002, TC 001.602/1999-3).";
VOTO condutor do Acórdão 3661/2009 - Segunda Câmara: "11. O primeiro aspecto que julgo oportuno avultar é que este Tribunal, com efeito, condena a prática da redistribuição por entender que ela configura a transferência, instituto banido da legislação pátria desde 1995, por meio de Decisão exarada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Mandado de Segurança n.º 22.1487-8/DF.”


O Tribunal de Contas da União exteriorizou, portanto, em inúmeros julgados, o seu entendimento acerca da matéria, deixando patente que, independentemente de o cargo a ser distribuído estar vago ou não, a intitulada redistribuição por reciprocidade consiste em uma idiossincrasia do sistema pós-inconstitucionalidade do instituto da transferência, a funcionar como mecanismo de fuga das amarras deixadas pela inviabilidade de movimentação de cargos entre quadros de pessoal diversos, outrora autorizada pelo sistema constitucional anterior.

Embora em tom mais aberto, o Conselho Nacional de Justiça também levantou a bandeira da restrição à utilização do instituto da redistribuição pelos tribunais ao apreciar o Pedido de Providências n° 0007137-14.2010.2.00.0000, apresentado pela Associação Nacional dos Servidores da Justiça do Trabalho (ANAJUSTRA), no qual  requisitava fosse recomendado aos tribunais a utilização do instituto da redistribuição por reciprocidade. A decisão restou assim ementada:

1. A redistribuição só deve ser praticada excepcionalmente e quando presente o interesse da administração, o qual deverá ser demonstrado em decisão fundamentada, uma vez que a Constituição determina que a forma de provimento inicial dos cargos vagos na Administração Pública é o concurso público.
2. Impossibilidade de recomendação da redistribuição, que depende da satisfação das exigências legais, dentre as quais se destaca o interesse da administração.
3. Pedido julgado improcedente.”  (o grifo não consta do original)
                                  
                                         Relevante notar que embora o Conselho Nacional de Justiça tenha invocado julgados do Tribunal de Contas da União e deixado transparecer certa modificação no entendimento anterior conferido sobre o tema[43], deixou de fechar pontos importantes sobre a aplicação da legislação de regência no âmbito do Judiciário, tais como: (i) a questão da competência[44] – tema fundamental sob o escopo da sistemática tratada neste ensaio -, e (ii) o ponto nodal da matéria, que cuida especificamente da inconsistência legal da própria redistribuição por reciprocidade, seja de cargos ocupados ou vagos[45].

Não obstante a transparência do entendimento dos órgãos de controle nos moldes acima externados, alguns órgãos e entes públicos ainda encontram brechas para motivar a redistribuição por reciprocidade, cujas interpretações, cada vez mais extensivas e dissociadas do arcabouço jurídico pátrio, abrem espaço para manutenção dos efeitos nocivos que esse vício traz à coletividade.

Na verdade, o desvirtuamento do sistema pela Administração, adornado de forma secundária no interesse público, torna o Poder Público vulnerável e, até mesmo, refém de toda a sociologia verificada para ingresso no serviço público, responsável por dar guarida à grande parcela do mercado de trabalho no Brasil. E, nesse passo, basta retomar ao que disse o Ministro Carlos Velloso no MS n° 22.148-8/DF e trocar a palavra transferência pela locução redistribuição por reciprocidade. Vale o exercício:

“...com a transferência[46], seria possível tangenciar o princípio: o candidato prestaria concurso público num determinado Estado onde a disputa não seria maior ou onde o meio intelectual fosse mais pobre, e por isso as provas seriam mais fáceis, e obteria, depois, a transferência para igual cargo noutro Estado, onde o concurso, observadas as peculiaridades locais, fosse mais difícil, com ofensa, assim, ao princípio da igualdade em relação aos que estivessem disputando o concurso público mais difícil.”


Na atualidade, os concursos públicos encerram toda uma anatomia de riscos para a Administração, mas o risco principal está na incerteza de manter o servidor recém nomeado na localidade de lotação do cargo para o qual logrou êxito. Basta verificar a incidência de pedidos formulados depois da posse visando qualquer tipo de afastamento, até mesmo para tratar de doença em pessoa da família longe do domicílio de lotação do cargo.

Por certo, a procura por facilidades para ingressar no serviço público é enorme. O primeiro desejo do candidato aprovado é ser nomeado e tomar posse no cargo, o outro, é conseguir ter exercício na localidade almejada. Assim, a abertura de portas que propiciem o êxodo do servidor para localidades alheias à circunscrição de seu Quadro de Pessoal, a exemplo da redistribuição, acaba por desencadear uma demanda interna cuja concorrência além de não ser isonômica, porque nem todos são guindados ao deslocamento, que fica a critério do gestor público; é desleal, seja pelas razões apresentadas no voto do Ministro Carlos Velloso, acima reproduzidas, seja pela total ausência de critérios objetivos para seu processamento. E, o fundamental: a redistribuição, enquanto instituto jurídico, não tem qualquer afinidade com aspirações individuais do servidor, posto ser ferramenta de movimentação de cargos em favor da Administração.

Nesse contexto, a vítima de todo esse processo é a coletividade, que não somente paga o preço pela demora no alinhamento da força de trabalho em ambiente público, como se ressente com a movimentação constante de profissionais concursados e que tem o dever de assumir as suas funções na lotação de destino[47].

                      A par de todo o arcabouço jurídico acima referenciado, evidencia-se que a utilização da denominada redistribuição por reciprocidade como ferramenta para salvaguardar interesses de servidores e, quiçá, da Administração - esta de maneira secundária -, não se coaduna com a sistemática própria do instituto, mormente por se apresentar como porta aberta ao clientelismo[48].


(iv) Conclusão



                     É inusitado imaginar que mediante provocação de terceiros, alheios a seu quadro de pessoal, possa a Administração vir a ter ciência de que possui deficiência de recursos humanos e, como tal, está habilitada a proceder à redistribuição de cargos, ocupados ou vagos.

                 A redistribuição é instrumento de ação administrativa. É ato que tem por objeto a recolocação de cargos dentro da estrutura administrativa de um dado órgão/ente. É ato que modifica a lotação, que modifica o tamanho e/ou a qualificação do Quadro de Pessoal, pois tem o condão de resolver problemas de reorganização, de gestão, de política de recursos humanos. Na redistribuição não há espaço para o interesse do particular.

                     Nesses termos, cabe enfatizar que cargo público necessário a qualquer órgão ou ente, existe para ser preenchido por meio de concurso público ou por outra forma de provimento permitida em lei, sempre em nome dos princípios basilares da legitimidade, da igualdade, da finalidade e da supremacia do interesse público.

                      

                           





[1]    ALVARES, Maria Lúcia Miranda. Pós-Graduada em Direito Administrativo /UFPA, autora do livro Regime Próprio de Previdência Social. Editora NDJ, e colaboradora de revistas jurídicas na área do Direito Administrativo. Artigo escrito em dezembro de 2011
[2]       No dizer de Diogo de Figueiredo Moreira Neto “Há um elenco de institutos básicos, doutrinariamente consolidados, sobre os quais, com ligeiras modificações, são estruturados os estatutos de servidores públicos. Não são muitos, mas devem ser considerados básicos, até mesmo para que os princípios e preceitos constitucionais, de obrigatória observância, em função deles ganhem sentido e coerência. In Curso de Direito Administrativo. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense: 2006, p. 288. (grifei)
[3]    Por certo, antes mesmo desse período já se encontra legislação dando azo à redistribuição de cargos em face da necessária dinâmica em que se insere a Administração Pública, a exemplo do Decreto nº 37.347, de 1955, que deu execução à Lei nº 711, de 1949, e determinou, ipsis verbis: "Art. 4º Os servidores constantes da relação anexa serão distribuídos pelos diversos órgãos do Ministério da Fazenda, mediante ato do Diretor do Serviço do Pessoal do mesmo Ministério, a medida que se tornarem desnecessários aos trabalhos da Câmara de Reajustamento Econômico."
[4]    A Reforma Administrativa de 1967, que já incorporava pontos básicos de um modelo gerencial de administração não chegou a concretizar os seus alicerces, mas serviu de base para sacramentar, sob as diretrizes agasalhadas, estruturas organizacionais fundadas nos princípios da clássica burocracia.
[5]    v. Decreto nº 6.944, de 21 de agosto de 2009, que estabelece medidas organizacionais para o aprimoramento da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, dispõe sobre normas gerais relativas a concursos públicos, organiza sob a forma de sistema as atividades de organização e inovação institucional do Governo Federal e dá outras providências.
[6]    Art. 37 da Lei n° 8.112/90.
[7]    In Servidor Público: remoção, cessão, enquadramento e redistribuição. 2 ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2005, p. 190.
[8]    ALVARES, Maria Lúcia Miranda.  O Sistema de Remoção dos Servidores das Carreiras do Poder Judiciário da União, Boletim de Direito Administrativo, São Paulo, Editora NDJ, nº 10, OUT/2009, pp. 1152/1162.
[9]    Vol. II, Regime Jurídico do Funcionário Público, 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1964, pp. 233/234.
[10] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 15 ed.  São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990, p. 357.
[11] José Cretella Júnior. (ob. cit. p. 235).
[12] Hely Lopes Meirelles (ob. cit. p. 358). Cabe lembrar que em face da dinâmica da Administração Pública, muitos órgãos e entes sofrem redefinição em sua estrutura, podendo, inclusive, vir a ser extintos. Nesses casos, se faz necessário o ajuste de lotação entre quadros diversos, hipótese em que se deslocam cargos, vagos ou não, de um quadro para outro do mesmo Poder. É o que se chama redistribuição, instituto jurídico que permite tal movimentação. Este instituto, como visto alhures, não se confunde com a remoção, que consiste no deslocamento do servidor (e não do cargo) no âmbito da lotação numérica do próprio quadro de pessoal.
[13] Nesse caso, os cargos passíveis de redistribuição passam à estrutura do órgão de destino, porém individualizados como cargos redistribuídos, paralelamente ao quadro de pessoal.
[14] Na verdade, o acréscimo de cargos em um dado órgão decorre da desnecessidade de cargos em outro, que terá diminuída a sua lotação, equilibrando a demanda da força de trabalho a partir dos diagnósticos de necessidades, geralmente agregados às questões vinculadas à reorganização administrativa, à criação ou extinção de órgãos e muitos outros, em que se impõem o reposicionamento de cargos para melhor atender ao interesse do serviço.
[15] Art. 37 da Lei nº 8.112/90.  Por certo alguns desses pressupostos são totalmente insubsistentes, eis que se o cargo é deslocado ele deve manter todas as suas características incólumes.
[16] v. Art. 39 , caput, da CF, por efeito da ADIN nº 2.134-4.
[17] O que não significa dizer que um servidor federal advindo de outro ente da federação não possa, por exemplo, ter o o tempo prestado nessa outra esfera de governo computado para tal ou qual efeito, ou usufruir de determinadas faculdades, observada logicamente a limitação prevista da legislação estatutária federal, ou mesmo a própria Constituição, quando esta versar sobre o tema.
[18] Em âmbito federal, esta é a autorização legislativa vigente para se processar a redistribuição de cargos, a ser conjugada com as regras de competência do órgão ou ente gestor do quadro geral de pessoal, conforme análise envidada neste ensaio.
[19] MELLO,  Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 136.  Interessante observar, ainda, que essa repartição interna de competência é denominada, pela doutrina, de desconcentração, e diz respeito à distribuição de atribuições em relação a uma só pessoa. A desconcentração não de confunde com a descentralização, que pressupõe a prestação de serviços/atividades por pessoas diversas do Estado, ou melhor, dá-se a descentralização quando o Estado presta serviço por intermédio de outros sujeitos: por ele criados (a exemplo das autarquias, sociedades de economia mista e empresas públicas), ou por particulares contratados (concessionários, por exemplo).
[20] A partir dessa época o Chefe do Executivo passou a se utilizar das Medidas Provisórias, encontrando nesse normativo a ferramenta para agilizar as suas ações em matéria de organização e funcionamento da Administração Pública.
[21] In Manual de Direito Administrativo. 16 ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris. 2006, p. 12.
[22] No campo da extinção de cargos vagos autoriza-se, também , a sua transformação sem aumento de despesa por ato inferior à lei, desde que sob o escopo da sobredita reorganização administrativa.
[23] Ob. cit. pp. 196/197.
[24] Art. 37...§ 1º A redistribuição ocorrerá ex officio para ajustamento de lotação e da força de trabalho às necessidades dos serviços, inclusive nos casos de reorganização, extinção ou criação de órgão ou entidade.
[25] O Art. 84, VI, “a”, da CF confere ao Presidente da República a prerrogativa de dispor, por meio de decreto, sobre a “organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos”.
[26] Nesse caso, a competência é do Poder Legislativo que, por meio de lei, autoriza a redistribuição em função da situação organizacional que faz especificar.
[27] V. Anexo I do Decreto n° 7.063, de 13 de janeiro de 2010, que aprova a estrutura regimental do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e dispõe no art. 35, I, o seguinte: Art. 35.  À Secretaria de Recursos Humanos compete: I - exercer, como Órgão Central do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal - SIPEC, a competência normativa em matéria de pessoal civil no âmbito da administração federal direta, das autarquias, incluídas as de regime especial, e das fundações públicas;”.
[28] A Portaria n° 57, de 14.4.2000, assim dispõe, in verbis: “Art. 1° Disciplinar os procedimentos relativos à redistribuição de cargos efetivos ocupados ou vagos da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, no interesse da Administração. Art. 2° Fica delegada a competência para a prática de atos de redistribuição de cargos efetivos vagos prevista no § 2° do art. 37 da Lei n° 8.112, de 11 de dezembro de 1990, aos Ministros de Estado e aos dirigentes máximos dos órgãos integrantes da Presidência.”
[29]     Salvo hipótese de a lei dispuser em contrário, com indicação de outro órgão ou ente para tal proceder.
[30] Redação dada pela Medida Provisória nº 2.216-37, de 2001.  Esse dispositivo não foi revogado pela Lei n° 10.683, de 2003, que também a dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios.
[31] Nesse caso, embora chamemos o instituto de redistribuição, trata-se, na verdade, de uma relotação de cargos e funções, na medida em que a redistribuição, enquanto instituto jurídico, é verificada quando o deslocamento de cargos ocorre entre quadros de pessoal diversos.
[32] Nesse caso, temos, efetivamente, a figura da redistribuição nos moldes versados na Lei n° 8.112/90.
[33] Não existe redistribuição por provocação, eis que é da essência do instituto a forma de ofício, vinculada ao interesse público.
[34] A exemplo de uma lei que extingue um tribunal ou um órgão judiciário e permite a redistribuição de seus cargos, observada a demanda dos demais.
[35] Não se diga que o art. 20 da Lei n° 11.416, de 2006, criou quadro único para as Justiças Especializadas. Sobre o tema remetemos a leitura do artigo O Sistema de Remoção dos Servidores das Carreiras do Poder Judiciário da União, Boletim de Direito Administrativo, São Paulo, Editora NDJ, nº 10, OUT/2009, pp. 1152/1162.
[36] Essa a essência da locução “quadro geral” disposta no art. 37 da Lei n. 8.112/90.
[37] Nesse caso, os tribunais remeteriam ao órgão gestor do sistema de redistribuição os indicadores necessários para a avaliação da lotação e a proposição de redistribuição como vetor do fortalecimento da capacidade institucional. Para tanto seria necessária regulamentação interna na matéria pelo Conselho Nacional de Justiça.
[38] No Legislativo, os cargos são criados, transformados e extintos por atos internos.
[39] Comunga de igual entendimento Paulo de Mattos Ferreira Diniz em sua Lei n° 8.112/90 Comentada.  (9.ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2006, p. 190).
[40] Não é demais lembrar que tal situação pode ocorrer por diversos motivos, dentre os quais se insere a decorrente de reestruturação administrativa. É que a reestruturação administrativa pode provocar a redução de atribuições de um dado órgão ou ente e, em contrapartida, o incremento das atividades de outro, tornando superavitária a lotação do primeiro, a demandar a utilização da redistribuição de cargos. Nessa perspectiva de reestruturação também se tem a possibilidade de extinção e criação de órgãos, a requisitar igual tratamento, consoante dito alhures.
[41][41] Assim entendida a redistribuição realizada, tão somente, para suprir a demanda do cargo redistribuído, consoante o disposto no art. 4° da Portaria n° 57, de 2000, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.
[42] MS n°22.148-8 DF, Relator Ministro Carlos Velloso.
[43] O próprio voto do Relator do Pedido de Providências traz as orientações antes traçadas pelo CNJ, cujas teses não parecem se coadunar com o teor do acórdão então proclamado.
[44] O primeiro aspecto diz respeito ao gestor do denominado quadro geral, cuja concepção nem ao menos existe no âmbito do Judiciário, tanto assim que está sendo previsto no Projeto de Lei n° 319/2007 tal hipótese, cujos alicerces serão ainda analisados pelas comissões do Parlamento, inclusive quanto ao aspecto da constitucionalidade. Mas o projeto impressiona pela simples leitura.
[45] O voto do Relator no Pedido de Providências fornece elementos para que se considere irregular tal forma de redistribuição, mas deixa margem a dúvidas.
[46] Leia-se: “redistribuição por reciprocidade”.
[47] A escolha do cargo é do candidato ao concurso que, efetivamente, tem conhecimento das localidades onde está sujeito a ter exercício. E disso tem conhecimento antes mesmo de se candidatar. Ao aceitar o cargo, submete-se à lotação correspondente. É a regra.
[48] A verdade, esse é o vício maior da utilização errônea do instituto. Os beneficiados, em tese, acabam sendo os eleitos pela Administração, haja vista a ausência de critérios objetivos para tal proceder. 

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