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DESAPOSENTAÇÃO NO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RPPS): REPERCUSSÃO DA DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE VEDA O INSTITUTO NO ÂMBITO DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS)

Por Maria Lúcia Miranda Alvares[1]

RESUMO: o Supremo Tribunal Federal (STF) conferiu repercussão geral à decisão que veda o instituto da desaposentação no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) por entender que o § 2º do Art. 18 da Lei nº 8.213/91 é constitucional e inexiste lei prevendo o referido instituto. No bojo dessa novel orientação, cabe saber se haverá repercussão da tese no Regime Próprio de Previdência Social(RPPS) diante da equivalência dos regimes pós-reforma, fato que se aborda no presente ensaio, aberto ao necessário debate.

PALAVRAS-CHAVES: Desaposentação; Regime de Previdência; servidor público, renúncia e aposentadoria.

ABSTRACT: The Supreme Federal Court (STF) has given general repercussions to the decision that prohibits the institute from unretirement in the General Social Security System (RGPS) because it understands that § 2º of Article 18 of Law 8.213/91 is constitutional and there is no law providing for the concerned. In the bulge of this novel orientation, it is necessary to know if there will be repercussion of the thesis in the Regime itself of Social Security (RPPS) before the equivalence of the postretirement regimes, a fact that is approached in this essay, open to the necessary debate.

KEYWORDS: unretirement ; Welfare Regime; Public servant, resignation and retirement.


(i) Contextualização do tema
         
          Em 27 de outubro de 2016, o Supremo Tribunal Federal (STF) adotou a seguinte tese de repercussão geral:

No âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por hora, previsão legal do direito à ‘desaposentação’, sendo constitucional a regra do artigo 18, parágrafo 2º, da Lei 8.213/1991[2]        
         
A mais alta Corte do Judiciário brasileiro, portanto, pôs fim ao instituto da desaposentação no RGPS, há muito consolidado pelo próprio Judiciário enquanto direito juridicamente possível em nosso arcabouço normativo.

Na verdade, é mais uma das teses em que o aceno inicial positivo do Poder Judiciário levou milhares de pessoas a erigir a desaposentação como tábua de salvação para os males decorrentes dos baixos benefícios previdenciários e do crescente custo de vida. E, agora? No campo do RGPS já se sabe que essa possibilidade não mais é possível, não obstante o necessário respeito às situações constituídas sob a égide da coisa julgada[3]. Mas, e quanto aos servidores públicos vinculados ao RPPS, como fica? Não mais será possível a desaposentação para esses servidores também? Como entender essa lógica a partir da fundamentação tardiamente acolhida pelo Excelso Pretório?

Este ensaio visa trazer luzes ao debate. Mas é bom que se diga, desde logo, que as luzes podem se apagar ao sabor da política eleita.


(ii) Histórico do instituto da desaposentação

          Antes de adentrar no histórico é preciso saber o significado ou a definição que se confere à desaposentação.

          Nesse passo, pode-se dizer que a desaposentação nada mais é do que o exercício do direito de renúncia a um benefício em manutenção com vistas ao usufruto de outro, mais vantajoso, mediante o cômputo do tempo de contribuição anterior e o atual, este último decorrente da mantença da relação previdenciária do segurado após a jubilação. Exemplificando: o segurado, ao implementar as condições para aposentadoria, tem a faculdade de exercer o direito à concessão do benefício e, ao fazê-lo, passa a receber os proventos correspondentes. Em regra, este segurado pode manter o vínculo trabalhista e continuar a contribuir para o regime previdenciário respectivo, materializando novo tempo de contribuição[4]. E sob o fundamento da dicotomia dos vínculos jurídicos (previdenciário e trabalhista), tem (ou tinha) o segurado a possibilidade de renúncia à aposentadoria e, por consequência, a faculdade de se aposentar com o cômputo das contribuições vertidas após a primeira jubilação com vistas a usufruto de benefício mais vantajoso, seja pelo RGPS, seja pelo RPPS.
          Sob o escopo da definição, pode-se dizer que a desaposentação teve assento em razão da possibilidade de o segurado manter um vínculo trabalhista ainda que detentor da condição de aposentado, conservando, desta feita, a cotização obrigatória para com a Previdência Social[5]. E essa possibilidade se sedimentou a partir do momento em que o próprio STF consolidou a tese da dicotomia entre os regimes trabalhista e previdenciário por ocasião da procedência da ADIn n° 1.721-3/DF, julgada em sessão plenária de 11/10/2006, nos seguintes termos:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 3º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.596-14/97, CONVERTIDA NA LEI Nº 9.528/97, QUE ADICIONOU AO ARTIGO 453 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO UM SEGUNDO PARÁGRAFO PARA EXTINGUIR O VÍNCULO EMPREGATÍCIO QUANDO DA CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO.

1. A conversão da medida provisória em lei prejudica o debate jurisdicional acerca da "relevância e urgência" dessa espécie de ato normativo.
2. Os valores sociais do trabalho constituem: a) fundamento da República Federativa do Brasil (inciso IV do artigo 1º da CF); b) alicerce da Ordem Econômica, que tem por finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, e, por um dos seus princípios, a busca do pleno emprego (artigo 170, caput e inciso VIII); c) base de toda a Ordem Social (artigo 193). Esse arcabouço principiológico, densificado em regras como a do inciso I do artigo 7º da Magna Carta e as do artigo 10 do ADCT/88, desvela um mandamento constitucional que perpassa toda relação de emprego, no sentido de sua desejada continuidade. 3. A Constituição Federal versa a aposentadoria como um benefício que se dá mediante o exercício regular de um direito. E o certo é que o regular exercício de um direito não é de colocar o seu titular numa situação jurídico-passiva de efeitos ainda mais drásticos do que aqueles que resultariam do cometimento de uma falta grave (sabido que, nesse caso, a ruptura do vínculo empregatício não opera automaticamente).
4. O direito à aposentadoria previdenciária, uma vez objetivamente constituído, se dá no âmago de uma relação jurídica entre o segurado do Sistema Geral de Previdência e o Instituto Nacional de Seguro Social. Às expensas, portanto, de um sistema atuarial-financeiro que é gerido por esse Instituto mesmo, e não às custas desse ou daquele empregador. 5. O Ordenamento Constitucional não autoriza o legislador ordinário a criar modalidade de rompimento automático do vínculo de emprego, em desfavor do trabalhador, na situação em que este apenas exercita o seu direito de aposentadoria espontânea, sem cometer deslize algum.
6. A mera concessão da aposentadoria voluntária ao trabalhador não tem por efeito extinguir, instantânea e automaticamente, o seu vínculo de emprego.
7. Inconstitucionalidade do § 2º do artigo 453 da Consolidação das Leis do Trabalho, introduzido pela Lei nº 9.528/97. (STF, ADIn 1.721/DF, Rel. Min. Carlos Britto, julgamento em 11/10/2006, DJ de 29/06/2007 – grifo nosso)

Na época, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já possuía jurisprudência no sentido de que a aposentadoria era um direito patrimonial disponível e, como tal, comportava renúncia por parte de seu beneficiário. Eis a tese acolhida em 2005 no RMS 17.874/MG, em que se cuidava de pedido formulado por servidora pública estadual aposentada:

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR ESTADUAL. APOSENTADORIA. RENÚNCIA. NOMEAÇÃO PARA OUTRO CARGO POR CONCURSO PÚBLICO. POSSIBILIDADE.
A aposentadoria é direito patrimonial disponível, sujeita à renúncia, possibilitando à recorrente a contagem do respectivo tempo de serviço e o exercício em outro cargo público para o qual prestou concurso público. Precedentes.  (STJ, RMS nº 17.874/MG, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ de 21/2/2005 – grifo nosso)

Nessa assentada foram citados precedentes do STJ acerca da tese da disponibilidade patrimonial dos benefícios previdenciários, tais como os decorrentes do Resp. 370.957/SC (Dj de 15/4/2002) e do Resp. 497.683/PE (DJ de 26/3/2003). E, a questão, naquela época, não parecia suscitar dúvidas quanto à liquidez do direito posto, conforme se pode constatar no MS 7.711/DF, por meio do qual o Ministro Paulo Gallotti concedeu segurança a um servidor, detentor do cargo de Advogado da União, que “objetivava o cancelamento de sua aposentadoria no INSS e a consequente expedição de certidão comprobatória do respectivo tempo de contribuição”[6].

          Vale observar que embora as situações acima indicadas versassem sobre a viabilidade da contagem recíproca de tempo de serviço/contribuição entre regimes previdenciários diversos, o que se tinha, efetivamente, era o debate acerca da possibilidade de renúncia à aposentadoria concedida pelo INSS (RGPS) e consequente utilização do respectivo tempo para consolidar novo benefício, seja para ter efeito em sede do próprio RGPS, seja para fazer face às aposentadorias do RPPS, a configurar, desde então, o que se convencionou chamar de desaposentação. E esse foi o pano de fundo de toda a discussão judicial que obteve tema favorável no STJ sob o escopo do Art. 543-C do CPC (recurso repetitivo), onde a figura da desaposentação foi efetivamente consolidada em âmbito judicial. Importante conferir:

EMENTA 

    [...]
3. Os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento. Precedentes do STJ.
[...]
(REsp 1334488 SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, Julgado em 08/05/2013, DJE 14/05/2013 – Tema 563 – grifo nosso)
      
          A consolidação do entendimento no âmbito do STJ espelhou, basicamente, a jurisprudência dos tribunais regionais federais que, de igual sorte, há muito já vinham firmando interpretação em igual sentido. Eis algumas decisões para certificação:

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE DESAPOSENTAÇÃO.
- O artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, garantia fundamental do cidadão, resolve a questão da lide. Somente a lei poderia vedar a renúncia a benefício previdenciário. O segurado aposentou-se em 04.03.1985 e, tanto o Decreto 89.312/84 como a Lei nº 8.213/91 não contêm proibição de renúncia. Afastada, em consequência, a invocação do artigo 58, § 2º, do Decreto 2172/97.
 - Os direitos sociais e o sistema previdenciário brasileiro, com sede constitucional, existem em razão de seus destinatários. Os limites de sua disponibilidade são balizados pela sua própria natureza. Trata-se de proteção patrimonial ao trabalhador. Quando se cuida de interesse material, em regra, cabe ao titular do direito correspondente sopesar as vantagens ou desvantagens. Assim, quanto aos direitos com substrato patrimonial, constitui exceção sua irrenunciabilidade, que sempre é prevista expressamente pelo legislador.
- Os efeitos da renúncia são ex nunc, ou seja, dão-se da manifestação formal para extinguir a relação jurídico-administrativa-previdenciária a aposentadoria. Nada vicia a concessão do benefício, que gerou consequências legítimas, as quais não se apagam com o ato de renúncia.
 - O impetrante tem direito à certidão de tempo de serviço. O órgão previdenciário computou o tempo para a concessão do benefício. A vedação de que um tempo de serviço não pode ser contado quando já tiver sido para aposentadoria de outro deve ser interpretada, à vista da cumulatividade de aposentadorias concomitantes e não sucessivas. A compensação financeira eventual dos regimes (art. 202, § 2º, C.F.) dar-se-á na forma da Lei n.º 9796/99, segundo o artigo 4º, inciso III, §§ 2º, 3º e 4º. - Remessa oficial e apelação não providas. (TRF 3ª Região, AMS 00007763319994036105, AMS - APELAÇÃO CÍVEL – 198863, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRET, DJU DATA:03/09/2002)

ADMINISTRATIVO. PREVIDENCIÁRIO. DIREITO DE RENÚNCIA À APOSENTADORIA. CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO.
-Inexiste lei que obste a renúncia à aposentadoria. Instrução Normativa não pode regulamentar o que não se encontra previsto em lei.
 - No caso, a matéria referente ao cancelamento da aposentadoria do impetrante deve se pautar pelo princípio da razoabilidade.
- Verifica-se a inexistência de lei que vede a desaposentação e a inocorrência de prejuízo para o Estado ou para o particular, com a renúncia ao benefício, bem como a presença de fortes motivos pessoais para o reconhecimento do pedido de cancelamento da aposentadoria, eis que o INSS a concedeu de forma provisória, o que implicará fortes prejuízos ao segurado, se não for confirmada a final. (TRF 2ª Região, AMS 200251015076400, AMS - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 48664, Relator Desembargador Federal FERNANDO MARQUES, DJU de 04/08/2003)

Isso não quer dizer que a matéria não comportou teses dissonantes. Comportou sim. E muitas. Vale a transcrição de uma das decisões que sintetiza os pontos da controvérsia, oriunda do Tribunal Regional Federal da 2ª Região:


“PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. DESAPOSENTAÇÃO. NÃO CABIMENTO. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO. RECURSO PROVIDO.
 - Reanalisando os posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários e melhor refletindo a respeito do instituto da desaposentação, passo a alinhar-me ao entendimento de que é cristalino o caráter irrenunciável e irreversível do ato de concessão do benefício de aposentadoria no âmbito do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, evidenciando seus efeitos ofensivos à ordem constitucional vigente.
 - À luz dos artigos 11, §3º e 18, § 2º, da Lei 8.213/91 e 3º, I, 40, 194 e 195 da CRFB, verifica-se que o instituto da desaposentação possui vedação legal expressa que se compatibiliza com o caráter solidário do sistema previdenciário, não sendo, portanto, permitida a utilização das contribuições dos trabalhadores em gozo de aposentadoria para a obtenção de nova aposentadoria ou elevação da já auferida, sob pena de subversão para um sistema individualista/patrimonialista que não se compatibiliza com os fundamentos da Seguridade Social. Assim, o aposentado que retorna à atividade somente faz jus ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado (artigo 18, §2º, da Lei 8.213/91).
- A aposentadoria é considerada um ato jurídico perfeito, cuja proteção mereceu respaldo constitucional (artigo 5º, XXXVI, da CRFB), sendo uma garantia ao direito fundamental da segurança jurídica. Ato jurídico perfeito é aquele já concretizado segundo a lei vigente ao tempo em que se aperfeiçoou, pois já satisfez todos os requisitos para gerar a plenitude dos seus efeitos e a aposentadoria, como tal, deve ser respeitada pelos envolvidos na relação jurídica, estando ainda imune às alterações legislativas em virtude do já consagrado princípio tempus regit actum. Por derradeiro, não há que se falar em modificação unilateral, diga-se, renúncia unilateral a este ato jurídico, dependendo a desaposentação necessariamente de requerimento e concordância da Administração Pública (órgão pagador e gestor do benefício), sob o pálio da lei.
 - A aposentadoria é também considerada um ato administrativo, cujo desfazimento volitivo se dá por meio da anulação ou revogação, cujos pressupostos lhes são próprios e inaplicáveis à desaposentação (aplicável, por exemplo, nas hipóteses de erro ou fraude na concessão do benefício). E como qualquer outro ato administrativo, é regido pelo princípio da legalidade (artigo 37, caput, da CRFB), que conduz toda a conduta dos agentes da Administração Pública, no sentido de que qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei, sendo que não há lei permitindo a concessão da desaposentação.
 - Sob qualquer ótica, a renúncia ao benefício da aposentadoria não é juridicamente aceitável. A uma, sob pena de afrontar o princípio da segurança jurídica, consistente no respeito ao ato jurídico perfeito (artigo 5º, XXXVI, da CRFB) e ao princípio da legalidade (artigo 37, caput, da CRFB c/c artigo 18, §3º, da Lei 8.213/91). Isso sem falar no princípio constitucional da isonomia (artigo 5º, caput, da CRFB), uma vez que a desaposentação confere tratamento mais benéfico ao segurado que se aposenta com proventos proporcionais e continua trabalhando para, posteriormente, obter nova aposentadoria em melhores condições, em detrimento daquele que continuou trabalhando até possuir um período contributivo maior para se aposentar com proventos integrais.
- A duas, porque se extrai a natureza alimentar da aposentadoria, que lhe confere o caráter de irrenunciável. Assim como a pensão alimentícia, no âmbito do direito civil, é possível a renúncia às prestações mensais, mas não ao benefício em si, que é intocável, intangível. A aposentadoria não é um direito patrimonial e, portanto, disponível, possuindo, outrossim, um caráter institucional, isto é, os direitos e obrigações não decorrem de ato de vontade, porém da lei.
– E a três porque a pretensão de desaposentação não é livre e desembaraçada, gerando ônus a pessoa jurídica de direito público diretamente envolvida na constituição do ato, no caso, ao INSS, sendo claro que o desfazimento da aposentadoria repercute em ônus no sistema previdenciário, uma vez que o mesmo período e salários-de-contribuição seriam somados duas vezes, com o objetivo de majorar a renda mensal da nova aposentadoria, o que repercute diretamente no equilíbrio financeiro e atuarial do sistema (artigo 201, caput, da CRFB).
- Ainda que se pretenda devolver os valores recebidos a título da aposentadoria que se pretende renunciar a desaposentação, mesmo assim, esbarra em obstáculos de ordem legal e constitucional.
- Mutatis mutandis, no que se refere à desaposentação, aplicam-se os mesmos fundamentos citados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 416827 - que concluiu a respeito da impossibilidade de aplicação da Lei nº 9.032/95 em benefícios de pensão por morte concedidos em momento anterior à sua vigência. Assim, ainda que o segurado pretenda renunciar à aposentadoria anterior para fins de obter outra mais benéfica, ainda que se trate de benefício de caráter alimentar, deve prevalecer o respeito ao ato jurídico perfeito (artigo 5, XXXVI, da CRFB) e ao princípio tempus regit actum e a preservação do equilíbrio financeiro e atuarial.
- A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, através do julgamento do AgRg no RESP 1.298.511/RS, adotou o entendimento de que o prazo decadencial previsto no artigo 103 da Lei 8.213/91 se aplica às demandas em que se pleiteia a desaposentação, (2ª Turma, AgRg no REsp 1305914 / SC, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 27/08/2012). A conclusão a que se chega é a de que não é possível a renúncia à aposentadoria, uma vez que é ínsito do ato de renúncia - ato de liberalidade - o seu exercício a qualquer momento. Caso fosse admissível a renúncia ao benefício de aposentadoria, igualmente seria possível a renúncia ao prazo decadencial fixado na lei, o que é terminantemente vedado pelo artigo 201 do Código Civil. - Ressalva de entendimento anterior. - Recurso provido.” (TRF 2ª Região, EIAC 200951020027693, 1ª Seção Especializada, Rel. Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO, DJe de 08/01/2013 – grifo nosso)

 À guisa desse roteiro jurisprudencial, o importante é constatar que essa diversidade de interpretação não foi capaz de contaminar ou de esmorecer a tese judicial eleita pelo órgão de cúpula do Judiciário, competente para dispor acerca da interpretação final das normas infraconstitucionais – o Superior Tribunal de Justiça (STJ)[7]. Nesse passo, pode-se dizer que a desaposentação existiu forte na jurisprudência pátria e se materializou disseminada pela certeza do direito posto.

Em ambiente administrativo, o INSS, enquanto entidade gestora do RGPS, não concedia a desaposentação. Era preciso ingressar com pedido em juízo[8], surgindo daí todo o arcabouço judicial acima alinhado. No campo do RPPS, a desaposentação sempre foi uma realidade fático-jurídica, agasalhada sem quaisquer embaraços para consolidação do direito de seus segurados – servidores públicos em sentido amplo.

Em análise histórica poderia se dizer que a desaposentação no RPPS serviu de inspiração para se consolidar a postura judicial adotada em sede do RGPS pelos tribunais pátrios. Vale conferir.

(iii) Da Desaposentação no RPPS

          Sabe-se que o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) passou por diversas fases, duas das quais se mostram evidenciadas de forma clara: a) de feição estatutária[9] e; b) de feição contributiva[10].

          Na primeira fase, os benefícios previdenciários eram nitidamente auferidos em função do vínculo do servidor com o Estado e por este custeado[11], sem contrapartida financeira do servidor, salvo em caráter acessório eis que a contribuição vertida não se erigia como pressuposto para a concessão de aposentadoria.

          Na segunda fase, ainda em desenvolvimento, o RPPS assume uma postura em que a contribuição importa para a concessão do benefício, passando a se cogitar de uma relação de caráter contributivo e atuarial, por meio da qual se imprime uma relação de especialidade entre os benefícios e as contribuições, fase que foi marcada com entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20/98. Nessa fase observa-se o ingresso no RPPS no bojo do sistema da Seguridade Social por meio da sua aproximação com o RGPS, situação essa que se pode dizer consolidada pela Emenda Constitucional nº 41/2003[12].

          Pois bem, nessa primeira fase a renúncia à aposentadoria era auferível sem maiores implicações, posto que o servidor aposentado (seja sob as regras RGPS, seja sob as do RPPS) possuía - como ainda se entende possuir - a prerrogativa de renunciar à aposentadoria para ter jus a nova, desta feita em cargo para o qual logrou aprovação por meio de competente concurso público. Essa renúncia era (e ainda deve ser) encaminhada ao Tribunal de Contas da União para o fim de cancelamento do registro da aposentadoria. Cabe confirmar:
Acórdão
Decisão 84/1992 – Primeira Câmara
Sumário
Aposentadoria. Pedido de renúncia motivado pela posse no cargo de Agente Arrecadador de Tributos Estaduais. Determinação para o cancelamento do registro. Ressarcimento das importâncias recebidas indevidamente.
          Relatório
Na Sessão de 26.09.1978 foi considerada legal a aposentadoria de Pedro Abelardo Mundim, no cargo de Carteiro, a partir de 1.08.1977, com fundamento na Lei Complementar nº 29/76 e art. 28 da Lei nº 1.229/50.
Na oportunidade, examina-se pedido de renúncia ao benefício, formulado pelo ex-servidor, em face de sua posse, em 06.05.1985, no cargo de Agente Arrecadador de Tributos Estaduais do Estado de Mato Grosso. 
No Ministério das Comunicações o pedido foi homologado pela Portaria nº 892, de 22.06.1987 (fls. 36), retificada pela Portaria de nº 1.704, de 20.11.1987 (fls 54), com efeitos a partir de 06.02.1987. Observa o órgão de instrução, 2ª IGCE, que o interessado exerceu o cargo em comissão de Chefe da Exatoria das Rendas
Estaduais de Rosário Oeste/MT no período de 25.05.1983 a 25.05.1987. Quanto ao cargo para o qual o servidor foi nomeado em caráter efetivo, esclarece que a titularidade desse cargo só se processou em 06.02.1987, não tendo ocorrido, portanto, acumulação ilícita de proventos com o exercício do cargo de natureza permanente, no período de 06.05.85 a 25.05.1987. 
Diante disso, propõe que se determine a averbação da renúncia no registro de sua aposentadoria a partir de 06.02.87, conforme Decisão da 1ª Câmara de 30.04.1991 no TC-007252/80-3.
O Ministério Público discorda da Inspetoria, porquanto consta do pedido do interessado que a posse e exercício no cargo efetivo ocorreu em 06.05.1985. Assim, e por entender que o exercício do cargo em comissão de
Exator-Chefe não impedia a posse e exercício do servidor no referido cargo de Auxiliar de Agente Arrecadador de Tributos Estaduais, para o qual fora nomeado pelo Decreto nº 1.321, de 06.05.1985, do Governo do Estado de Mato Grosso, manifesta-se no sentido de que seja determinado o cancelamento da aposentadoria, no cargo de Carteiro, a partir de 06.05.1985, recomendando-se ao órgão de origem "que torne sem efeito o ato de fls. 54 e promova o ressarcimento das importâncias recebidas indevidamente no período de 06.05.1985 a 05.02.1987".
É o relatório.
Voto
Com efeito, declarou o servidor, no expediente de fls. 28, endereçado à Diretoria da Divisão de Aposentadorias e Pensões do antigo Ministério das Comunicações, que desde 06.05.1985 ocupava cargo no Estado, deixando de apresentar o pedido de renúncia, à época, em virtude da exigência de um estágio probatório de dois anos de exercício no cargo, para efetivação dos concursados.
Este fato não impede que, para uma nova aposentadoria, agora pelo Estado, como pretende o servidor, seja o seu tempo de serviço, na esfera estadual, computado a partir de 06.05.1985, quando tomou posse e entrou no exercício do cargo de Auxiliar de Agente Arrecadador de Tributos Estaduais, e pelo qual vinha percebendo vencimentos.
Isto posto, acolho as conclusões do digno Representante do Ministério Público e voto por que seja adotada a decisão que ora submeto a esta Câmara. (TCU – 1ª Câmara, Processo 043.255/1977-9, Relator Ministro Homero Santos, data da sessão 24/3/1992, sem registro de publicação, grifo nosso)

Acórdão
Decisão 178/98 – 2ª Câmara
Sumário
Aposentadoria. Nomeação para outro cargo público. Pleito de renúncia da aposentadoria. Cancelamento do registro. Determinação à DAMF/RJ no sentido de promover o devido ressarcimento das importâncias eventualmente recebidas a maior.
Relatório
Trata o presente processo a aposentadoria do servidor Arly Pereira de Souza, Mensageiro da Delegacia de Administração do Ministério da Fazenda no Estado do Rio de Janeiro - DAMF/RJ.
2. A 2a SECEX procedeu à instrução dos presentes autos nos seguintes termos (fls. 87): 
"A aposentadoria do(a) inativo(a) em epígrafe foi julgada legal por esta Corte em Sessão de 29/04/1982 (fls. 30v). Retornam os autos a este Tribunal, visto que, mediante o requerimento de fls. 59, o(a) inativo(a) pleiteia a renúncia de sua aposentadoria, por haver tomado posse em outro cargo, desejando aproveitar o tempo de
serviço para nova aposentadoria
.
Conforme se observa às fls. 59, o(a) interessado(a) tomou posse no cargo de Técnico III, no Instituto Nacional de Tecnologia. Por intermédio da Portaria n. 277, publicada no DOU de 08/09/1997 (fls.85), foi acolhida e homologada a renúncia à aposentadoria formulada pelo(a)interessado(a), com efeitos a partir de 01/01/1997.
Considerando a vasta jurisprudência deste Tribunal a respeito da matéria (Decisão 20/94 - Segunda Câmara - Ata 05/94, Processo n. TC 006.243/91-6; Decisão 178/97 - Segunda Câmara - Ata 23/97, Processo TC n. 014.056/96-8, entre outras), proponho o cancelamento do registro da
presente aposentadoria, e a consequente anotação nesta Secretaria,
 determinando, ainda, ao órgão de origem que proceda ao acerto de contas do(a) interessado(a), com vistas ao ressarcimento de valores eventualmente recebidos a maior dos cofres públicos, nos termos do art. 46 da Lei 8.112/90
." 
3. O Ministério Público endossa a proposta da Unidade Técnica, no sentido de que "seja determinado o cancelamento da presente aposentadoria e a anotação nos registros daquela Secretaria, determinando-se ao órgão de origem que proceda ao ressarcimento das importâncias eventualmente recebidas a maior, nos termos do art. 46 da Lei n. 8112/90, com a redação dada pela Lei n. 9.527/97" (fls. 88).
4. É o relatório.
Voto
Ante os elementos que compõem os autos e a jurisprudência predominante nesta Corte, acolho os pareceres uniformes e voto por que o Tribunal adote a Decisão que ora submeto à deliberação desta Câmara. (TCU – 2ª Câmara, Relator José Antônio Barreto de Macedo, data da sessão 30/7/98, DOU de 20/8/98 – grifo nosso).

Visualiza-se que a aposentadoria do servidor era tida como um direito disponível. Aliás, essa conotação de aposentadoria enquanto direito disponível e, portanto, passível de renúncia, podia ser encontrada, em alguns casos, no próprio texto legal, a exemplo da Lei nº 6.903, de 30 de abril de 1981[13], que cuidou da aposentadoria dos Juízes Classistas e Temporários, in verbis:

Art  9º Ao inativo do Tesouro Nacional ou da Previdência Social que estiver no exercício do cargo de juiz temporário e fizer jus à aposentadoria nos termos desta Lei, é lícito optar pelo benefício que mais lhe convier, cancelando-se aquele excluído pela opção.  (grifo nosso)

No bojo desses esclarecimentos iniciais, cabe um parêntese para lembrar que com a promulgação da Constituição de 1988, em 5/10/88, cogitou-se cabível não somente a acumulação de aposentadoria do RPPS com exercício de cargo público efetivo, como a viabilidade de percepção de mais de uma aposentadoria pelo mesmo regime, situação que perdurou até a Emenda Constitucional nº 20/98, que ora vedou expressamente a percepção de proventos pagos pelos cofres públicos com vencimentos oriundos de cargo efetivo não acumulável na atividade, assim como a concessão de mais de uma aposentadoria pelo RPPS, ressalvadas as hipóteses de acumulação permitidas.

Melhor esclarecendo: antes da Constituição de 1988 era vedado acumular o exercício remunerado de cargo público efetivo com proventos de aposentadoria pelo RPPS[14], assim como não se fez possível tal prática sob a sua égide, muito embora tenha havido entendimento em sentido favorável que acabou por dar ensejo ao disposto no Art. 11 da EC nº 20/98[15], não obstante tenha a referida Emenda inserido no texto constitucional vedação expressa à respectiva acumulação (Art. 37, § 10)[16], com as ressalvas às acumulações permitidas. Desse modo, excluídas as hipóteses de acumulações cabíveis, somente foi dado o direito ao servidor inativo à nova aposentadoria mediante renúncia ao benefício. A renúncia à aposentadoria, portanto, sempre foi o caminho de quem almejava galgar um benefício mais vantajoso, conforme depreende-se das decisões retro colacionadas.

 Sob tal alicerce, fácil é vislumbrar que a renúncia à aposentadoria no RPPS foi continuamente tida como um direito passível de ser exercido por seu titular[17], situação que não se modificou com a segunda onda de reforma trazida pelas Emendas 41/2003 e 47/2005, por meio das quais se consolidou a feição contributiva do sistema. Vale conferir:

Acórdão TCU nº 258/2004 – 1ª Câmara

Sumário
Aposentadorias antes consideradas legais indevidamente. Insubsistência da Relação nº 76/2002, inserida na Ata nº 42/2002, Primeira Câmara, Sessão de 26/11/2002, nos termos do § 2º do art. 260 do Regimento Interno desta Corte de Contas, prevalecendo a decisão em face dos demais interessados. Nova apreciação das duas aposentadorias. A primeira, considerada legal. A segunda, constando cumulação de proventos de aposentadoria com os de Reforma remunerada. Cargos inacumuláveis na atividade. Vedação constitucional. Ilegalidade. Negativa de registro. Possibilidade de o interessado fazer jus à aposentadoria de Pessoal Civil do Exército renunciando à Reforma remunerada. Determinações. Aplicação da Súmula nº 106.
Acórdão
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de aposentadoria dos Srs. Armando do Carmo Guimarães e Lauro Fernando da Silva Serra, ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão da 1ª Câmara, ante as razões expostas pelo Relator e com fundamento nos arts. 1º, inciso V, e 39, inciso II, ambos da Lei nº 8.443, de 16 de julho de 1992, c/c o art. 259, inciso II, do regimento Interno, em: 

9.1. tornar insubsistente, em relação apenas aos Srs. Armando do Carmo Guimarães e Lauro Fernando da Silva Serra, a Relação nº 76/2002, inserida na Ata nº 42/2002, Primeira Câmara, Sessão de 26/11/2002, nos termos do § 2º do art. 260 do Regimento Interno desta Corte de Contas, prevalecendo a decisão em face dos demais interessados; 
9.2. considerar legal o ato de fls. 04/06, relativo à aposentadoria do Sr. Armando do Carmo Guimarães, autorizando-lhe o registro correspondente, nos termos do § 1º do art. 260 do Regimento Interno desta Corte de Contas;

9.3. considerar ilegal o ato de fls. 01/03, relativo à aposentadoria do Sr.. Lauro Fernando da Silva Serra, ante a impossibilidade de percepção acumulada de proventos decorrentes de dois cargos inacumuláveis na atividade, negando-lhe o correspondente registro, nos termos do § 1º do art. 260 do Regimento Interno desta Corte de Contas;
9.4. dispensar o ressarcimento das importâncias percebidas indevidamente pelo interessado, com fulcro na Súmula nº 106 da Jurisprudência desta e. Corte de Contas;
9.5. determinar ao órgão de origem que: 
9.5.1. com fundamento nos arts. 71, inciso IX, da Constituição Federal e 262 do Regimento Interno desta Corte, faça cessar, no prazo de 15 (quinze) dias, os pagamentos decorrentes do ato impugnado, contados a partir da ciência da presente deliberação, sob pena de responsabilidade solidária da autoridade administrativa omissa;
9.5.2. dê ciência desta deliberação ao interessado, Sr. Lauro Fernando da Silva Serra, informando-o de que poderá, entretanto, optar pela aposentadoria no cargo da Diretoria de Pessoal Civil do Exército, desde que renuncie à Reserva remunerada de Coronel do Exército. Caso assim o for, o órgão de origem deverá editar novo ato concessório, submetendo-o à deliberação desta Corte de Contas; 
9.5.3. esclareça ao interessado que, se consumada a hipótese descrita no subitem anterior, o tempo de serviço efetivamente prestado nas Forças Armadas (Exército) poderá ser averbado para fins de alteração da proporcionalidade dos proventos da aposentadoria concedida pela Diretoria de Pessoal Civil do Exército; 
9.5.4. observe os termos do art. 16 da IN nº 44/2002;
9.6. determinar à Sefip que verifique a implementação das medidas determinadas nos subitens 9.5.1 a 9.5.4 supra.” (Acórdão TCU- 258/2004-1ª Câmara, Rel. Augusto Sherman, sessão de 17/02/2004 - grifo nosso)

Acórdão TCU nº 209/2004 - Plenário
Sumário
Aposentadoria compulsória de Procurador Autárquico da LBA. Acumulação com aposentadoria no cargo de Assistente Social do Ministério da Justiça. Ilegalidade da Concessão reafirmada em Pedido de Reexame. Recurso de divergência do art. 234 do Regimento Interno anterior e Incidente de Uniformização de Jurisprudência do novo Regimento (art. 91). Conhecimento. Provimento. Possibilidade de opção pelos proventos da aposentadoria mais vantajosa. Ciência ao recorrente e ao interessado.
Acórdão
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de concessão de aposentadoria, em fase de Recurso de Divergência, previsto no art. 234 do Regimento Interno anterior, interposto contra as Decisões 365/2001 e 365/2002, ambas da 2ª Câmara. 
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, antes as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. conhecer do Recurso de Divergência, interposto pelo Subsecretário de Planejamento, Orçamento e Administração da Secretaria Executiva do Ministério da Previdência e Assistência Social, Sr. Marcos de Oliveira Ferreira, nos termos do art. 234 do Regimento Interno desta Corte, aprovado pela Resolução/TCU nº 15, de 15 de junho de 1993, ora revogado, para, no mérito, dar-lhe provimento; 
9.2. acrescentar o item 8.4 à Decisão nº 365/2001, proferida pela 2ª Câmara neste processo, em Sessão de 4/12/2001, Ata nº 44/2001, nos seguintes termos:
8.4. orientar o Ministério da Previdência e Assistência Social que o inativo poderá optar pela aposentadoria do cargo de Procurador, desde que renuncie à aposentadoria concedida pelo Ministério da Justiça, devendo o MPAS submeter um novo ato concessório à apreciação deste Tribunal.”

9.3. dar ciência da presente deliberação ao recorrente e ao Sr. Arnóbio Cabral.
Relatório
Trata-se de Recurso de Divergência, previsto no art. 234 do revogado Regimento Interno deste Tribunal, contra a Decisão nº 365/2001 (fls. 86, vol. Principal), prolatada pela 2ª Câmara desta Corte, e mantida pela Decisão nº 365/2002 (fls. 106, vol. Principal), também daquele colegiado. 
[...]
7 De fato, a Sefip propôs que se desse direito ao interessado de optar entre a aposentadoria do cargo de Assistente Social, exercido no Ministério da Justiça, no período de 30/07/46 a 23/05/82, e a do cargo de Procurador, exercido na extinta Fundação Legião Brasileira de Assistência, no período de 18/03/57 a 12/12/90. No entanto, isso não foi acatado pelo Relator da decisão recorrida, Ministro Valmir Campelo, conforme se depreende de seu voto (fl. 85 do Vol. Principal), in verbis: ... ponho-me em acordo com o Ministério Público e com a Sefip, no sentido de que a presente concessão não pode prosperar, estando eivada de vício insanável de legalidade, apenas alertando para a impossibilidade do exercício da opção aventada nos pareceres. (destaque nosso)

7.1 Em que pese a posição do Ministro-Relator, adotada pela 2ª Câmara, acreditamos que ela está em desacordo com diversos julgados desta Corte de Contas, como consignou a recorrente, que convergem no sentido de conferir aos inativados que ocuparam cargos inacumuláveis na atividade a possibilidade de optar pela aposentadoria de um deles (Decisões 105/2001 e 07/2002, ambas da 1ª Câmara; e Decisões 14/2002, 46/2002 e 442/2002, todas da 2ª Câmara).
7.2 Em nosso entendimento, é plausível tal possibilidade, porquanto o inativado, mesmo ocupando irregularmente outro cargo na administração pública, acabou, em tese, recolhendo parte de sua remuneração para a seguridade social.
7.3 A propósito, entendemos pertinente trazer à baila elucidativo excerto da Proposta de Decisão do insigne Ministro Augusto Sherman Cavalcanti nos autos do TC 017.485/2000-5, que fundamentou a Decisão nº 007/2002 - Primeira Câmara, in verbis

(...) Se não é dado ao servidor perceber proventos provenientes de dois cargos inacumuláveis, pode ele, por outro lado, averbar o tempo de serviço prestado em um dos cargos, colimando alterar a proporcionalidade da aposentadoria pela qual optar, eis que não houve coincidência de períodos de exercício dos cargos aludidos. É amplamente aceita pela jurisprudência desta Corte a possibilidade de averbação de tempo de serviço por servidor que renuncia a aposentadoria em determinado cargo, para aposentar-se em outro (cf. Decisão nº 325/98 - Segunda Câmara, Decisão nº 3/99 - Primeira Câmara, Decisão nº 179/99 - Primeira Câmara, Decisão nº 48/2001 - Segunda Câmara).’

7.4 Assim, para que o interessado possa se aposentar no cargo de Procurador da extinta LBA é necessário que renuncie da aposentadoria do cargo de Assistente Social, exercido no Ministério da Justiça. Ademais, deverá averbar junto ao MPAS o período de tempo que exerceu exclusivamente neste cargo, portanto, excluindo o período de exercício concomitante nos dois cargos. 
(Acórdão TCU nº 209/2004-Plenário, Rel. Ministro Lincoln Magalhães da Rocha, sessão de 10/03/2004 - grifo nosso)

Acórdão nº 1.468/2005 - TCU - PLENÁRIO

Sumário: Consulta. Câmara dos Deputados. Acumulação dos proventos de aposentadoria, em um órgão, com os vencimentos e o exercício de cargo efetivo, em outro. Renúncia da aposentadoria já na vigência da Emenda Constitucional 41/2003, com o intuito de averbar o tempo de serviço, nela anteriormente empregado, tendo em vista a obtenção de nova e mais benéfica inativação. Impossibilidade de renúncia com efeitos retroativos. Inexistência de direito adquirido a estatuto jurídico. Precedentes do TCU e do STJ. A aposentadoria caracteriza-se como direito disponível, cuja renúncia é sempre possível. Possibilidade de contagem do tempo de serviço, com o intuito de obter nova aposentadoria, com sujeição às regras das Emendas Constitucionais 41/2003 e 47/2005. Conhecimento. Resposta ao consulente. Arquivamento

VOTO REVISOR

Solicitei vista dos autos deste processo em razão da relevância da matéria, cujo deslinde poderá afetar a relação jurídica existente entre a Administração Federal e milhares de servidores públicos concursados, mas detentores de uma aposentadoria anterior, do regime próprio ou do regime geral de previdência.
A tese do relator quanto à impossibilidade de conceder efeitos retroativos à renúncia é irretocável e encontra-se em consonância com a jurisprudência da Corte Superior de Justiça (vide MS 14.523-SP).
Se até véspera da publicação da Emenda Constitucional n.º 20/1998 o servidor não havia ao menos formulado seu pedido de renúncia de modo a possibilitar a contagem de tempo de serviço necessário à aposentação, é de concluir que, até aquele momento, não havia implementado as condições para a aposentadoria.
Apenas com a renúncia e com o conseqüente cancelamento dos pagamentos pode-se cogitar na concessão do novo benefício, mormente quando é vedada a acumulação de duas aposentadorias. Uma vez que a concessão é regida pelas normas vigentes no momento em que os requisitos legais e constitucionais são implementados, o servidor não pode ter sua aposentadoria regulada por normas já revogadas.
Dessarte, considero que a matéria foi tratada com propriedade, razão pela qual acompanho o eminente relator Walton Alencar Rodrigues.
9. Acórdão:
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator e com fundamento no art. 1º, inciso XVII, da Lei 8.443/92, em:
9.1. conhecer da consulta para respondê-la nos seguintes termos:
9.1.1. apenas após a efetiva renúncia da aposentadoria anterior, o tempo de serviço que lhe deu suporte e foi nela empregado pode ser novamente utilizado para respaldar a aquisição de direito à nova aposentadoria, ou seja, somente a partir desse momento, pode haver a transmutação da mera expectativa de direito em direito adquirido, vedada a concessão de efeitos retroativos ao ato de renúncia, regendo-se, desse modo o novo ato de aposentadoria pelo direito positivo vigente por ocasião do implemento dos seus requisitos;
9.2. encaminhar cópia deste acórdão, acompanhado do relatório e voto que o fundamentam, ao Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados e do Senado Federal; e
9.3. arquivar o presente processo. (Acordão TCU nº 1.468/2005 -  PLENÁRIO, Rel. Ministro Walton Alencar Rodrigues, sessão de 21/9/2005, grifo nosso)

          AS decisões são claras. O caráter contributivo assumido pelo RPPS pós-reforma, à equivalência com o RGPS, não se erigiu como elemento capaz de infirmar o direito à renúncia à aposentadoria. Aliás, pode-se afirmar que a aposentadoria no campo do RPPS sempre foi tida como um direito disponível. E essa disponibilidade lhe foi garantida sob o escopo de um direito passível de desistência, passível de ato de vontade de seu titular, não obstante as ingerências do regime jurídico-administrativo sobre essa relação, a exemplo da vedação à acumulação remunerada de cargos públicos, à cassação de aposentadoria, aos efeitos do tempo de serviço/contribuição, dentre outros.

No mais, resta dizer que não existe norma impeditiva à desaposentação no RPPS, diversamente do que se encontra atualmente do RGPS sob entendimento oferecido pelo STF.

Historicamente, portanto, verifica-se que o RPPS parece ter inaugurado a viabilidade de desaposentação, sempre em sentido favorável na busca pelo melhor benefício.

 (iv) Repercussão da decisão do STF no RPPS
               
          O Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria, que a desaposentação é figura inaplicável no campo do RGPS ante a inexistência de sua previsão na legislação previdenciária[18]. Esse fundamento foi permeado por outros que o circundaram[19], a saber:

Ø  no RGPS, a criação de qualquer benefício somente pode ocorrer mediante lei, haja vista que a Constituição (Arts. 194 e 195) remete à “legislação ordinária as hipóteses em que as contribuições vertidas ao sistema previdenciário repercutem, de forma direta, na concessão dos benefícios.”
Ø  existência de contraposição entre a desaposentação e o fator previdenciário, este enquanto instrumento criado para combater as aposentadorias precoces acabaria por ficar limitado diante do estímulo à inatividade ocasionado pela desaposentação.
Ø  a feição contributiva e solidária do sistema significa que todos devem arcar com a sua sustentabilidade, de modo que o equilíbrio do sistema não se dá entre a contribuição e o financiamento do benefício;
Ø  a feição estatutária ou institucional e não contratual do RGPS, inteiramente regrado por lei, não confere espaço para intervenção individual, de modo que a ausência de previsão legal do direito equivale à inexistência de dever de prestação por parte da Previdência Social;
Ø  a Constituição não estabelece vínculo entre o recolhimento da contribuição previdenciária e o benefício recebido e que a regra da contrapartida, prevista no § 5º do seu art. 195, significa que não se pode criar um benefício ou serviço da Seguridade Social sem a correspondente fonte de custeio.
         
A par dos fundamentos, percebe-se que o direito à desaposentação foi tratado como um benefício e não propriamente como um direito à renúncia de um bem jurídico disponível, consoante jurisprudência até então pacífica dos tribunais pátrios.

Sob tal ótica, o benefício deveria estar previsto em lei para assim autorizar o seu exercício pelo titular e, em contrapartida, o dever de ser satisfeito pelo órgão gestor de previdência. Essa é, na verdade, a regra para a concessão de todo benefício previdenciário, seja ele do setor público ou privado: previsão legal.

Mas a desaposentação não é um benefício previdenciário. A desaposentação é um direito de renúncia a um benefício –benefício a que tem jus o segurado por conta do implemento das condições dispostas nas regras previdenciárias conjugadas com a vontade dele usufruir. A vontade do segurado é o elemento que se agrega à concessão do benefício. E o sentido de renunciar está diretamente relacionado com a essa vontade. É a vontade invertida.

Essa conotação parte da premissa de que a aposentadoria, no modelo brasileiro, passou a assentar-se, preponderantemente, no que se convencionou chamar de a lógica do seguro[20], erigindo-se como uma propriedade social de seu titular e enquanto tal, disponível ao exercício de renúncia ou dispensa. Essa dimensão, todavia, não foi acolhida pelo Excelso Pretório que assentou os fundamentos de sua decisão na solidariedade do regime, cuja base – escorada principalmente na lógica da assistência – também não parece se contrapor à atuação da desaposentação.

A saber:

É importante deixar claro que, a aposentadoria, no Brasil, seja a prevista no RGPS, seja a regrada pelo RPPS, passou a assumir, após as ondas de reformas da Previdência, um contexto efetivamente contributivo. Ou melhor, as contribuições vertidas ao sistema condicionam a sua concessão. Não existe benefício previdenciário, no Brasil, sem contribuição. Já passamos da época do tempo de serviço. Hoje estamos no tempo de contribuição, o que não significa estarmos diante de um sistema de capitalização, pois faltam as bases fundantes para tanto. Mas o caminho que se está seguindo é da capitalização escritural, porque, sem dúvida, no sistema brasileiro atual, se condiciona o benefício à contribuição, de modo que a solidariedade invocada como alicerce de sustentação dos regimes de previdência merece ser interpretada à luz do contexto em que se insere a Previdência no âmbito da Seguridade Social.

Em outras palavras, tomam-se os fundamentos da Seguridade Social, que alberga a saúde, a previdência e a assistência, cuja diversidade das bases de financiamento é efetivamente solidária, assim traduzida pelo escopo do Art. 195 da Constituição, e os transferem isoladamente para Previdência Social, não obstante a efetiva especialização da fonte de custeio a ela destinada e intensificada pós-reformas[21].

Ademais, confunde-se solidariedade com o regime de financiamento do sistema. Não que não exista vínculo entre um e outro, mas o formato de financiamento do regime de previdência não significa solidariedade, conforme acaba sendo assimilado. Pelo menos em um contexto jus-político. Adote como exemplo a aposentadoria no RPPS antes das reformas: a sua base de financiamento era totalmente orçamentária, sustentada por tributos gerais, mediante cotização obrigatória de toda coletividade. Dessa constatação, pode-se dizer que todos contribuíam para a aposentadoria do RPPS e, como tal, imanente a solidariedade do regime. Com as reformas, a especialização da fonte de custeio, patente na introdução do caráter contributivo e atuarial do sistema, se impôs a lógica do seguro, aproximando o RPPS do RGPS, onde as contribuições importam efetivamente para cobertura dos benefícios, materializando o deslocamento da previdência do escopo da solidariedade agasalhada pela Seguridade Social.

No regime de repartição simples, consubstanciado na cotização obrigatória de todos que dele participam, inclusive, dos próprios aposentados e pensionistas, a sua base, no contexto pós-reforma, não deixa de denotar feição agregada a um seguro social institucionalizado, onde a especialização de contribuições para fazer face ao seu custeio empresta ao regime o formato de capitalização escritural, mediante o qual a contribuição é registrada em contas individuais que servem de base para a concessão dos benefícios[22].

Nesse contexto, fácil é perceber que a solidariedade que se diz imanente ao RGPS não confere fundamento para desconstituir a intitulada desaposentação, mormente porque a desaposentação não deve ser tida como benefício previdenciário, mas um direito dele decorrente e, como tal, pode ser exercido sem que esteja em lei previsto, pois se cuida de um direito vinculado à disponibilidade desse bem social. Ademais, a opção atual pela aposentadoria com o fator previdenciário[23], ainda presente no RGPS, somente reforça a tese da desaposentação e não o contrário, pois deixa evidenciar que o segurado pode dispor acerca do benefício que lhe for mais vantajoso.

Outro aspecto importante a ser elucidado diz respeito aos efeitos do tempo de contribuição do segurado aposentado que retorna à atividade, conforme previsto no § 2º do Art. 18 da Lei nº 8.213/91. Ora, a vedação ali disposta é destinada ao segurado aposentado e não ao desaposentado.  Ao segurado que renuncia deve ser dado o direito de dispor do seu tempo de contribuição em igualdade de condições com qualquer outro segurado, posto que a renúncia rompe com o benefício de cunho continuado, a liberar o referido tempo para cômputo de uma aposentadoria mais vantajosa[24]. Nada a inviabilizar a sustentabilidade do sistema, ante a vinculação causal entre a contribuição e o benefício, como dito alhures[25] e que, como dito, não desnatura a solidariedade do sistema, pois uma situação não invalida a outra.

Nesse cotejo, resta evidenciado que os alicerces utilizados para negar o direito à desaposentação no RGPS trazem elementos de conflito sob o prisma conceitual, mormente em relação à ótica da sustentabilidade, cuja visão eminentemente jurídico-financeira acabou por anuviar a balança da justiça do Tribunal Constitucional Brasileiro. No bojo desses contrapontos, cabe a indagação: _a decisão exarada pelo STF que nega o direito à desaposentação no RGPS tem repercussão junto ao RPPS?

A resposta deve ser negativa. Não haverá, pelo menos neste primeiro momento, repercussão da decisão junto ao RPPS. E são muitos os fatores que levam a essa constatação. Cabe enumerar:

Ø  diferentemente do RGPS, não existe dispositivo legal equivalente ao Art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91 na disciplina do RPPS;

Ø  o aposentado pelo RPPS ainda se encontra amarrado às ingerências do regime jurídico-administrativo que, dentre outras limitações, veda a acumulação de proventos oriundos do RPPS com vencimentos de cargos ou empregos públicos e, como tal, submete o retorno à atividade desse segurado à reversão ao cargo antes ocupado, na forma do art. 25, II, da Lei nº 8.112/90[26]; ou à renúncia à aposentadoria para provimento em cargo efetivo decorrente de aprovação em concurso público; em ambos os casos com a possibilidade de concessão de nova aposentadoria pelas regras vigentes no momento da concessão;

Ø  nos estatutos jurídicos que vinculam o servidor ao ente federado existem regras que autorizam o cômputo do tempo de serviço público para efeito de aposentadoria, a exemplo da prevista nos Arts. 100 e 103, da Lei nº 8.112/90, sem discriminação quanto à qualidade do segurado, se aposentado ou não;

Ø  a concessão do benefício da aposentadoria está vinculada ao tempo de contribuição, a exemplo do que ocorre no RGPS, de modo que não existe benefício sem contribuição e nem contribuição sem benefício;

Não se vislumbra, portanto, repercussão da decisão do STF, que negou a figura da desaposentação em sede do RGPS, no campo do RPPS.
Sob tal perspectiva, entende-se inexistir impedimento para que o INSS expeça certidão de tempo de contribuição em favor de segurado do RPPS que renuncie ao benefício previdenciário concedido pelo RGPS[27], haja vista que a vedação do Art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/91 é destinada ao segurado do RGPS e não do RPPS. Ademais, a aposentadoria que vier a ser concedida, com o aproveitamento do tempo de contribuição antes utilizado para o RGPS, observará as regras do RPPS, observada a compensação financeira entre os regimes.

(v) Conclusões

          No momento em que se anuncia a proposta de reforma da Previdência Social, consubstanciada na PEC 287/2016, eis que a desaposentação fenece como direito imanente ao segurado do RGPS, caminho do qual não está imune do RPPS, muito embora a decisão do STF sobre ele não tenha repercussão.

          Poderia se cogitar que a igualdade que se pretende implantar entre os regimes, por efeito de eventual aprovação da PEC 287/2016, seria a base para acolher a tese da existência de repercussão da decisão do STF sobre a desaposentação em sede do RPPS. Mas nem seria preciso buscar tal motivação, posto que a desaposentação não se mostrará vantajosa sob às regras propostas na PEC nº 287/2016 para quaisquer regimes, salvo em relação a possíveis contemplados com as regras de transição.

          É que a renúncia à aposentadoria, tenha sido esta concedida pelo RPPS ou pelo RGPS, não opera efeitos retroativos, de modo que as regras vigentes no momento da aposentadoria (pós-desaposentação) são as que devem ser aplicadas ao destinatário do direito. Logo, se as regras advindas dessa onda de reforma forem aprovadas e estiverem em vigência no momento da aposentadoria, não haverá vantagem na desaposentação para qualquer segurado. Pelo menos em tese.
          Em outras palavras, ainda que se tenha chegado à conclusão de que a desaposentação permanece incólume, até então, em favor do servidor público vinculado ao RPPS, o horizonte cinzento se avizinha para extirpar o brilho da vantagem.

          No mais, não se pode deixar de criticar a atuação do Poder Judiciário diante da grande ilusão criada em torno da desaposentação. Todos acreditaram na sua conformidade jurídica avalizada pelo órgão de cúpula do Judiciário para dizer o direito em sede infraconstitucional – o Superior Tribunal de Justiça. E, mais uma vez, o Supremo Tribunal Federal põe por terra a última palavra[28]. Muito preocupante.

          E que seja feita a sua vontade!     



REFERÊNCIAS

ALVARES, Maria Lúcia Miranda. Regime Próprio de Previdência Social¸ Editora NDJ, São Paulo: 2007.
BOSCHETTI, Ivanete. A Reforma da Previdência e a Seguridade Social Brasileira. In: Lauro Morhy (Org.).  Reforma da Previdência em questão. Brasília: Universidade de Brasília, Laboratório de Estudos do Futuro/ Gabinete do Reitor: Editora Universidade de Brasília, 2003.
MACHADO, Hugo de Brito. A Contribuição dos Inativos. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?Id=5202. Acesso em 20/10/2006.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, S. C. Curso de Processo Civil - Vol. 2 - Processo de Conhecimento - 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008




[1] Pós-Graduada em Direito Administrativo/UFPA, autora do livro Regime Próprio de Previdência Social. Editora NDJ, colaboradora de revistas jurídicas na área do Direito Administrativo. Palestrante, instrutora e conteudista de cursos na área do Direito Administrativo, autora do Blog Direito Público em Rede.
[2] Tema de Repercussão Geral nº 503, Leading Case RE 661.256 RG/SC. Até o final deste artigo (em 8/12/2016) ainda não havia sido disponibilizado o Acórdão relativo à decisão. Resumo da decisão no Informativo nº845.
[3] A decisão do STF não autoriza a redução de proventos de aposentadoria de segurados que obtiveram ganho judicial com trânsito em julgado da ação. Para esses, somente por meio de procedência de eventual ação rescisória será possível desconstituir o julgado. A decisão do STF foi conferida em controle difuso e, em que pese a repercussão geral, somente aproveita os processos pendentes. Para os segurados que não estão cobertos com o trânsito em julgado, deve-se levar em consideração o retrocesso social que emerge em relação aos que já vêm usufruindo do benefício em face de antecipação de tutela ou mesmo de concessão em âmbito administrativo. Para esses, o tempo de percepção do benefício deve ser levado a cotejo sob o fundamento maior da estabilidade das relações jurídicas, até mesmo porque o aceno do Judiciário, em pacífica jurisprudência, jamais pode ser relevado diante da materialização efetiva das demandas. Os princípios que vedam o retrocesso social devem ser chamados a tutelar o caos que advirá com o cumprimento da tese eleita pelo STF.
[4] Mas pode também, o mesmo segurado, vir a trabalhar após aposentado, sem que tenha mantido contínuo o vínculo anterior. Bastante o seu retorno ao mercado de trabalho para assim voltar a contribuir para a Previdência Social, seja do setor público ou privado.
[5]O aposentado pelo RGPS que continuava a trabalhar e a contribuir detinha, antes da Lei nº 8.870/94, o direito de receber o valor das contribuições vertidas após a aposentação em parcela única (Pecúlio). A Lei nº 8.870/94 isentou o referido segurado da contribuição e, desta feita, extinguiu o direito ao Pecúlio, nos seguintes termos: “Art. 24. O aposentado por idade ou por tempo de serviço pelo Regime Geral da Previdência Social que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida pelo mesmo, fica isento da contribuição a que se refere o art. 20 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. Parágrafo único. O segurado de que trata o caput deste artigo que vinha contribuindo até a data da vigência desta lei receberá, em pagamento único, o valor correspondente à soma das importâncias relativas às suas contribuições, remuneradas de acordo com o Índice de Remuneração Básica dos Depósitos de Poupança com data de aniversário do primeiro dia, quando do afastamento da atividade que atualmente exerce.” (grifo nosso). Em 1995, a Lei nº 9.032 coloca esse segurado na condição de contribuinte obrigatório, porém, sem qualquer contrapartida decorrente do tempo de contribuição posterior à aposentação, salvo reabilitação profissional e salário-família (em completa violação ao caráter contributivo-retributivo do sistema), advindo daí a força dos fundamentos à desaposentação em sede do RGPS. O aposentado do RGPS, entretanto, pode acumular proventos de aposentadoria com a remuneração de cargos e empregos públicos, sendo este um dos fundamentos levado a motivar a renúncia à aposentadoria, haja vista a possibilidade de aposentação junto ao RPPS. O aposentado pelo RPPS, de outra banda, não pode acumular proventos com a remuneração de cargos e empregos públicos, de modo que este, igualmente, acaba sendo outro fundamento a motivar a desaposentação, desta feita no âmbito do RPPS, conforme se detalhará no tópico seguinte.

[6] STJ, MS 7.711/DF, Rel. Ministro Paulo Gallotti, DJ de 9/9/2002.
[7] Art. 105, inc. III, al. “a”, da CF/1988. Não se pode esquecer, como refere Luiz Guilherme Marinoni; Sérgio Cruz Arenhart que “ao Superior Tribunal de Justiça a Constituição Federal reservou a função de guardião da aplicação e da interpretação adequada da lei federal. Suas atribuições, portanto, tocam diretamente no exame da adequada aplicação da lei federal pelos tribunais brasileiros, dando homogeneidade ao trato desta pelas cortes nacionais e garantindo que essa lei – por maiores que sejam as dimensões do território nacional, as diferenças culturais, as realidades locais e as composições dos tribunais inferiores, estaduais e federais -, por ser uma só para todo o Brasil, seja aplicada e interpretada de maneira única por todo o Judiciário.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, S. C. Curso de Processo Civil - Vol. 2 - Processo de Conhecimento - 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 571)
[8] O requerimento administrativo passou a ser requisitado como condição para propositura na ação judicial ex vi do decidido pelo STF, em repercussão geral, no RE 631.240/MG (Acórdão publicado no DJE em 10/11/2014 - ATA Nº 167/2014. DJE nº 220, divulgado em 07/11/2014).
[9] Usa-se a expressão para deixar visível a contraposição entre os tipos de financiamentos do regime e a sua gradativa integração à Previdência Social, deixando o RPPS de ser objeto de estudo específico do Direito Administrativo.
aposentadoria no RPPS: a primeira fase de cunho orçamentário, onde a aposentadoria era custeada integralmente pelos cofres públicos; e a segunda, com a introdução de um regime de repartição simples com nuances de um regime de capitalização escritural.
[10] Tratamos da análise dessas fases do livro de nossa autoria: ALVARES, Maria Lúcia Miranda. Regime Próprio de Previdência Social¸ Ed. NDJ, 2007, pp. 5/11.
[11] Veja que o Art. 231, § 2º, da Lei nº 8.112/90, em sua redação originária, estabelecia que a aposentadoria do servidor seria custeada pelos cofres públicos.
[12] Ob.cit. pp 44/83.
[13] A Lei nº 6.903/81 foi revogada pela Lei nº 9.528/97.
[14] Art. 99, § 4º da CF/69.
[15] A ausência de norma vedando a percepção de proventos de aposentadoria com vencimento decorrente de exercício de cargo público na Constituição de 1988 fomentou entendimento no sentido de que era possível tal proceder e, realmente, o Art. 11 da EC nº 20/98 acabou por confirmar essa viabilidade, não obstante o entendimento conferido pelo STF no RE 163.204-6/SP (DJ de 14.11.94, p. 30.855), no sentido de que a acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela constituição”. De qualquer sorte, ainda que muitos tenham admitido essa possibilidade de acumulação, não se entendeu cabível a percepção de mais de uma aposentadoria pelo RPPS, salvo as exceções relativas aos cargos acumuláveis na atividade. Sobre o tema: Decisão TCU nº 96/2000 – 2ª Câmara; Acórdão nº TCU – 1162/2003 – 1ª Câmara; Acórdão nº TCU 1209/2003 – 1ª Câmara e outras. Em relação a acumulação de proventos decorrentes de reforma militar sob a égide da Constituição 1967/69 com proventos de aposentadoria de cargo público civil antes da EC nº 20/98, o entendimento foi pela permissibilidade consoante afirmado pelo STF no MS 25.090/DF.
[16][16]Vale a transcrição dos artigos da Constituição Federal, com as alterações da EC nº 20/98: “Art. 37. (...) § 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.” “Art. 40. (...) § 6º - Ressalvadas as aposentadorias decorrentes dos cargos acumuláveis na forma desta Constituição, é vedada a percepção de mais de uma aposentadoria à conta do regime de previdência previsto neste artigo.” De qualquer sorte, foi ressalva as situações constituídas nos termos do Art. 11 da citada Emenda. Ei-lo: Art. 11 - A vedação prevista no art. 37,  § 10, da Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese, o limite de que trata o  § 11 deste mesmo artigo.” (grifo nosso)
Importante ressaltar que a vedação de acumulação de proventos com remuneração de cargo público efetivo não abrangeu as aposentadorias concedidas pelo RGPS. O entendimento do STF em relação ao § 10 do Art. 37 da CF, incluído pela EC nº 20/98 é sentido de que vedação de acumulação de proventos de aposentadorias com a remuneração de cargos públicos não abrange aqueles decorrentes de benefícios concedidos pelo RGPS. (ARE n. 796.044-AgR, Rel. Ministra Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe 13.6.2014; ARE nº 914.547/SP-AgR, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 29/8/16; ARE 975.648/SP, Rel. Ministro Dias Toffoli, DJ de 28/11/2016)
[17] v. Acórdão TCU nº 317/2003- 2ª Câmara; Acórdão TCU nº 1596/2003 – 1ª Câmara; Acórdão TCU nº 1742/2003-1ª Câmara; Acórdão TCU nº 1803/2003 – 1ª Câmara; Acórdão TCU nº 3111/2003- 1ª Câmara; Acórdão TCU nº 1840/2003-Plenário e outros no mesmo sentido. Os acórdãos foram sedimentados, em sua maioria, na seguinte orientação oriunda do próprio STF: “o STF reiterou esse entendimento no MS 22.182-8, impetrado contra ato que condicionou a posse de oficial da reserva remunerada do Exército no cargo de Técnico Judiciário à renúncia concomitante aos proventos da reserva remunerada; “ (excerto do Acórdão TCU nº 1803/2003 – 1ª Câmara/ grifo nosso) .
[18] O entendimento pela constitucionalidade do § 2º do art. 18 da Lei 8.213/1991 (“§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado”) foi acolhido para assentar o impedimento legal do acolhimento da desaposentação.
[19] Fonte: Informativo STF nº 845, de 24 a 28 de outubro de 2016. Até o fechamento deste artigo não haviam sido disponibilizados os Acórdãos nos RE 381.397/RS e RE 661.257/SC.
[20]No dizer de Ivanete Boschetti, a “lógica do seguro” se assenta na contribuição do segurado. Nesse modelo, o acesso à previdência é condicionado a “uma contribuição direta e anterior e o montante das prestações é proporcional à contribuição efetuada”. Esse modelo de seguro social tem origem na Alemanha de Bismark. O seu oposto, é a “lógica da assistência”, implementada na Inglaterra do Pós-Segunda Guerra Mundial, e consiste na garantia de direitos universais, “destinados a todos os cidadãos incondicionalmente ou submetidos a condições de recursos (testes de meios), mas garantindo mínimos sociais a todos em condições de necessidade. O financiamento é proveniente majoritariamente, e as vezes exclusivamente, dos impostos fiscais e a gestão é pública.” Atualmente, não existe modelo puro. Hoje os sistemas de seguridade social em diversos países combinam as características desses modelos, podendo dar ênfase maior para um ou outro. BOSCHETTI, Ivanete. A Reforma da Previdência e a Seguridade Social Brasileira. In: Lauro Morhy (Org.).  Reforma da Previdência em questão. Brasília: Universidade de Brasília, Laboratório de Estudos do Futuro/ Gabinete do Reitor: Editora Universidade de Brasília, 2003, p.28/29.
[21] Art. 167, XI, da CF, incluído pela EC nº 20/98.
[22] Os registros das contribuições são realizados individualmente em cadastro próprio (CNIS – Cadastro Nacional de Informação Social) disponibilizado para consulta por meio do NIT (PIS/PASEP). Por intermédio do CNIS pode-se obter informações dos vínculos de emprego, dos períodos, do tempo de contribuição e do valor das contribuições vertidas no período trabalhado, assim como da remuneração que serviu de base. São essas informações individuais que conferem ensejo ao mapa do tempo de contribuição, enquanto requisito indispensável à concessão do benefício.
[23] Com a promulgação da Lei nº 13.183, de 4 de novembro de 2015, o fator previdenciário passou a ser facultativo, por liberalidade do segurado (Art. 29-C, da Lei nº 8.213/91 – inclusão).
[24]Veja que o benefício é concedido ao segurado até a sua morte. Nesses termos, se o segurado aposentado renuncia ao benefício passa a ter o direito, a partir de então, à liberação do tempo de contribuição que serviu de base para sua concessão. Não tem sentido, sob a lógica do seguro social acolhida pelo Texto Maior para custear a Previdência, vedar o usufruto desse direito, pois para o fim previdenciário a contribuição atua como pressuposto da concessão do benefício.
[25] Hugo de Brito Machado, em artigo doutrinário divulgado no endereço http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?Id=5202 intitulado Contribuição dos inativos, registra o seguinte conceito de contribuição: “Diferentemente dos impostos, as contribuições têm uma finalidade específica e constitucionalmente determinada. Mas isso não basta para caracterizá-las: a finalidade deve ainda ser buscada mediante uma atuação estatal, atuação causada por um grupo de pessoas do qual o contribuinte faça parte. É exigida, portanto, uma referibilidade indireta entre o contribuinte e a atuação estatal que justifica a cobrança da contribuição. Como decorrência disso, embora nem sempre sejam determinados na Constituição, os fatos imponíveis das contribuições também devem estar relacionados com a finalidade a ser alcançada com a exação e com a participação do contribuinte no grupo correspondente”.
[26] O Art. 25, II, da Lei nº 8.112/90 faz previsão da reversão no interesse da Administração, figura jurídica que esta articulista considera inconstitucional, por violar o princípio do concurso público. Entrementes, cabe dizer que a reversão no interesse da Administração não se confunde com a desaposentação. A reversão é forma de provimento derivado de cargo público mediante o qual o servidor retorna para exercer do mesmo cargo antes ocupado ou o decorrente de sua transformação. A desaposentação, por seu turno, consiste na renúncia ao benefício da aposentadoria para possibilitar o retorno à atividade do segurado aprovado em concurso público para provimento em cargo público não acumulável, a viabilizar a concessão de nova aposentadoria no cargo mais vantajoso.
[27] A certidão deve compreender todo o período contributivo desde a filiação até a data da aposentadoria junto ao RGPS.
[28] O mesmo ocorreu com a vantagem dos quintos no RE nº 638.115/ CE. 

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